OS 15 MOMENTOS QUE DEFINIRAM 2010


UM TÍTULO IDEAL PARA UMA RETROSPECTIVA DE 2010 SERIA “O PRIMEIRO ANO DO RESTO DAS NOSSAS VIDAS”, TOTALMENTE INSPIRADO NO FILME DO JOEL SCHUMACHER DE 1985. NUMA CENA, DOIS AMIGOS DE INFÂNCIA CONVERSAM, “SEMPRE PENSEI QUE SERÍAMOS AMIGOS PRA SEMPRE”, DIZ O PRIMEIRO.

“BEM, SUBITAMENTE O PRA SEMPRE FICOU MAIS CURTO”, RESPONDE O OUTRO
.
O FILME TRATA DUM ASSUNTO CARO AOS SURFISTAS, A BRUTAL CHEGAD
A À VIDA ADULTA. NESSE ANO QUE PASSOU, O SURFE PROFISSIONAL FINALMENTE CHEGOU A SUA MAIORIDADE COM A REPENTINA E SURPREENDENTE PERDA DO ANDY IRONS E A FORMA AMADORA E IRRESPONSÁVEL COMO A ASP E PATROCINADORES SE COMPORTARAM NA OCASIÃO. NADA FOI MAIS IMPACTANTE EM 2010.

NEM MESMO O ESPETACULAR DÉCIMO TÍTULO DO SLATER.

TALVEZ POR ISSO MESMO ELE PERMANEÇA EM CENA ─ ISSO É CONVERSA PRA MAIS TARDE. 2010 FOI A MAIOR VIRADA DA ASP DESDE A CRIA
ÇÃO DO WCT E OS TOP 44 EM 1992.

A INSTITUIÇÃO QUE APONTA A D
IREÇÃO DO SURFE PROFISSIONAL OUSOU COMO NUNCA ANTES, DIVIDIU AINDA MAIS SEU CIRCUITO EM CATEGORIAS (WORLD TOUR, STAR E PRIME EVENTS) E, SUPOSTAMENTE, UNIFICOU SEU RANKING.

SUPOSTAMENTE
PORQUE APENAS OS 32 (OPS, 34) PRIMEIROS PODEM SER CAMPEÕES MUNDIAS E O CERCO FECHA AINDA MAIS.


TAJ É O HOMEM A SER BATIDO
Não havia alma viva que duvidasse da capacidade do Taj Burrow vencer o circuito até abril.

De dezembro a março, Taj venceu o Pipe Masters batendo Slater na final, ganhou o primeiro evento do ano em que competiu, o Breaka Burleigh, WQS que tinha Fanning, Occy, Andy, Dusty e Owen entre os competidores e pra terminar, ou começar, coroou seu irresistível ritmo vitorioso fazendo uma final (e ganhando!) com Jordy Smith no Quik Pro da Gold Coast.

Tudo indicava que os anos como coadjuvante tinham chegado ao fim.

Indo mais pra frente, um terceiro em Bells, liderança tranqüila no ranking e a próxima etapa, Brasil ─ único país do mundo onde Taj tem três eventos no bolso.


UM ALLEY OOP DE PÉ QUEBRADO MUDA A HISTÓRIA
Dia nublado em Winkipop. A praia lotada espera ansiosa a bateria, Kelly Slater × Dusty Payne.

Corre o boato de que Slater quebrou o pé. Depois de perder para Jordy Smith na Gold Coast e fazer apenas a sexta melhor média da primeira fase em Bells, uma derrota para Dusty pode acelerar o processo de aposentadoria do maior surfista de todos os tempos.

Dusty abre com um 9.17 e passa o resto da bateria em busca duma nota baixa ─ Slater avança e sai d’água mancando.

Dois dias depois, ainda sob efeito de fortes analgésicos indicados por um amigo jogador profissional de rugby, Slater vai passando pelos seus adversários com sua 5’8” um a um até enfrentar um Mick Fanning destinado à vitória.

Quando tudo parecia resolvido, Kelly acerta um inacreditável e inesperado alley oop e muda a história do surfe profissional.

Gabriel Medina vence a categoria Junior com espetaculares aéreos em Bells ─ indo, somente ele, para a esquerda.


CAPITÃO NASCIMENTO NADA, JADSON É NOSSO HERÓI
Num ano em que os celebrados Dusty Payne, Pat Gudauskas, Matt Wilkinson, Adam Melling e Owen Wright são os novatos mais aguardados para surpreender a turma do andar de cima, Jadson André, dentre todos, é o único a vencer um evento em 2010. O sempre sorridente Jadson aterrissou consistentemente seus reverses até o final.

Passando por Dane Reynolds, restava apenas Kelly Slater para o sonho virar realidade. Ninguém apostava numa derrota do Careca depois dele ter virado uma bateria já liquidada contra um tarimbado Mineiro em 2009.

Não seria o inexperiente Jadson a pôr fim no jejum de 12 anos, ou seria?

Jadson provou com essa vitória que o circuito não pertencia apenas ao fechado grupo dos top 6 e, finalmente, a nova geração chegava pra ficar.

Slater percebe que não há refeição gratuita a caminho do décimo.

Estava aberta a corrida para revelação do ano.


CORTEM AS CABEÇAS!
Hora do primeiro e fatídico corte de 44 para 32. São degolados todos que não se encaixam nos novos critérios da ASP, curiosamente surfistas com mais de 30 anos, personalidade forte e surfe pouco criativo.

Adeus, Michael Campbell (que perdeu esquisito pro Adam Melling numa bateria que poderia mudar seu ano), adeus Marco Polo, Neco, Blake, Drew, Tanner, Ben Dunn, Dingo, Kekoa, Jay e Withs, foi bom enquanto durou, agora de volta ao calabouço do WQS.

Pat Gudauskas salva-se na última volta do ponteiro com um rodeo-clown muito mais parecido com um el-rollo dos anos 80 do que a manobra que Jordy completou em 2009.

Slater fez seu primeiro 10 do ano.

Manoa Drollet despacha duma vez só, Jordy e Taj, facilitando a vida do Careca ─ mal sabia ele quem o esperava na semifinal...


QUEM SEGURA JORDY?
Depois de quase amargar uma descida ao QS no seu primeiro ano entre os top 45, Jordy Smith vai subindo degrau por degrau o ranking da ASP.

Com um terceiro, um nono e um quinto, Jordy chegou em casa, Jeffrey’s Bay, na vice-liderança da corrida ao título.

Uma vitória em casa poderia levá-lo ao número 1 e ao seu inevitável destino de ser campeão mundial.

Com Sean Holmes fazendo o trabalho sujo de tirar KS e AI do seu caminho, Jordy levou a torcida à loucura na semifinal contra Bede ─ a virada mais espetacular desde... Jadson contra Bourez e Reynolds no evento anterior.

Um Taj conservador e inseguro fica em terceiro e continua na briga pelo seu tão almejado título mundial.

Slater, irritado, cai duas posições.

Jordy fica muito bem como dono do mundo, resta saber se agüenta o peso.


AVE, ANDY, OS QUE VÃO MORRER, TE SAÚDAM...
A fome estava lá, o surfe ainda tinha algum brilho de quem uma vez fôra o surfista mais temido do Tour, mas por algum motivo, Andy era apenas uma sombra do tricampeão que conhecemos. O ano sabático lhe fez bem, já não enlouquecia depois de cada derrota e, talvez por isso mesmo, aparentava apatia nas primeiras etapas.

Agora estávamos no Tahiti, seu lugar predileto. Foi no Tahiti que Andy surgiu avassalador para a ASP e seus companheiros.

Claro que Pipe era seu quintal, todos sabiam disso, mas Teahupoo era a sala de estar onde Andy recebia seus convidados com um caldeirão fervente de MEDO. Primeiro foi Fanning, depois Slater... o devoto C.J. nunca foi páreo para o infernal desejo de triunfo do velho e bom Andy.

A seqüência de vitoriosos era exuberante, Taj, Kelly, Jadson, Jordy e agora Andy estava de volta.

O circuito dos sonhos podia não ter ondas de sonho mas tinha uma autêntica e empolgante corrida ao título.


NOVO FORMATO, VELHO CONHECIDO.
Tudo que se sabe sobre esse evento é que o nível de surfe foi para o espaço.

Jordy, Dane e Owen fizeram até chover em Trestles.

Ondas que mais pareciam rampas, tamanho ideal para exibir a última palavra em surfe moderno e tempo suficiente para aproveitar o melhor que a mais divertida onda do Tour tinha para oferecer.

Evidentemente, Jordy não deixaria escapar a chance de fincar os dois pés no topo do ranking, nem Taj.

Bem, Slater teve a mesma idéia e vocês conhecem sua notória obsessão.

20 anos depois de ter causado assombro nesse mesmo lugar ao ganhar uma etapa do circuito americano, Slater ressurge como o mesmo predador de sempre e rejuvenesce duas décadas para desespero da concorrência.


SACA 3 × 2
Tiago Pires tem um início de ano fantástico.

Vence todas as baterias da primeira fase que disputa e escapa da degola.

Pelo caminho deixa um rastro de destruição que passa por Martinez, Taj, Mineiro e Slater (3 × 2 pro Saca!).

Na primeira etapa perde uma bateria polêmica contra o nome do circuito de 2010, Jordy Smith.

Saca não tem vida fácil, pega Fanning num final de tarde em Winkipop mexido, com séries demoradas ─ ele espera e a série vem alguns segundos depois de tocar a buzina.

Em J. Bay, perde pro Taj num erro milimétrico de escolha de onda. Vai na primeira da série e Taj surfa a onda do evento na onda de trás ─ TB faz a melhor média do evento.

Reafirma sua autoridade em ondas de qualidade, com Teahupoo, com um quinto.

Classifica-se entre os 32.


FANNING QUEBRA, OWEN TAMBÉM
O liquidificador francês funciona como nunca.

Jadson prova ao mundo que não é surfista de apenas uma manobra e arrasa com Wilko e Jeremy ─ este último num duelo de tubos incrível em que prevalece a técnica do potiguar de entubar de backside.

Taj perde para Dan Ross (13) e Jordy para Fanning (5) nas quartas.

Owen Wright quebra quantas pranchas encontra pela frente na tentativa inútil de mostrar ao que veio ─ nessa altura, depois do The Search em Supertubos 2009, todos já sabem.

Slater enfrenta Fanning (e perde) numa final sombria, ondas de 10 pés, correnteza, fechando.

Pouco importa, minutos antes o maldito Careca surfa seu segundo 10 do ano, ainda mais impressionante que o primeiro no Tahiti e deixa seu companheiro de circuito na indelicada situação de admitir que, sim, ele é de outro planeta.


STEPH
As mais belas pernas do Tour, ponto.

Por trás da cigana/hippiezinha sorridente brilha a estrela da mais letal competidora da história do surfe profissional.

Stephanie Gilmore detém todos os recordes que faltam ao maior de todos, King Kelly, campeã mais jovem, campeã no seu primeiro ano de Tour, campeã seguida, campeã, campeã, campeã, campeã...

Apesar de não ter o backside à altura do seu fantástico frontside (sem trocadilhos), Steph compensa seus pontos fracos com estratégias sempre perfeitas, do início ao fim. Pra direita, em ondas de qualidade, não tem competição e arrisco dizer que se houvesse meia dúzia de etapas em ondas como Bells ou Sunset com competição mista, ela fazia a malinha de mais da metade do contingente que se aventura no WQS.

Carissa apresenta-se mais versátil e ainda com o mesmo sorriso simpático pra cada vitória ou derrota.

Silvana tem de sobra o mais complicado de tudo, talento. Mas de alguma maneira não consegue transformar toda energia que tem para surfar em resultados.

Com a chegada do fenômeno Tyler Wright, o bicho vai pegar em 2011.


UM BRINDE PARA TRAVIS LOGIE
Em Portugal o espevitado sul-africano Travis Logie teve seu momento de glória nos 300 anos de Tour que parece resistir.

Primeiro amassou Dane Reynolds em Supertubos na segunda fase do Rip Curl Peniche Pro, deixando desolados milhares de fãs que clamavam por uma onda mais do Messias.

No dia seguinte, ainda quente da excitação de bater Dane, Logie faz a gentileza de tirar o homem que Slater considera mais perigoso da corrida ao título.

Todas as vezes que Fanning ganhou na França, levou o título no final do ano.

Taj perde pro Matt Wilkinson...

Sem Taj e Fanning, os portugueses têm o privilégio de ver Slater abandonar a má sorte que o perseguiu por 14 anos em Portugal e fazer a final dos sonhos de todo entusiasta, Jordy versus Kelly.

Hora do troco.

Slater* dá o xeque-mate.

*
Um alley oop na semifinal contra Davo arranca aplausos do próprio adversário, ainda dentro d’água...


A SEMANA MAIS INTENSA DE TODAS
Andy se foi.

Mal podíamos acreditar. Sozinho? Em Dallas? Por quê? Muito especula-se, pouco apura-se.

No terror da perda, todos nos calamos.

Já não há mais o que falar e nada que for dito pode mudar a tragédia que é perder um ídolo aos 32 anos, prestes a ser pai.

A ASP não sabe como reagir, a Billabong não sabe como reagir, seus amigos têm todos o mesmo olhar perdido.

Tanta coisa por fazer, tão pouco tempo...

E ainda temos um campeonato para terminar.

Dane, Jordy e Owen são uma vez mais os destaques, mas é Adriano de Souza o grande personagem do dia quando, contra tudo e contra todos, resolve competir a sério no grande momento de glória do Slater.

Uma silenciosa e apaixonada homenagem ao maior algoz do Kelly, Andy.

Slater finalmente enfrenta Taj, nas semis ─ e vence.

Em fila, durante o ano, foram Owen, Mick, Jordy e Taj, um a um.

Em Puerto Rico vem mais uma nota 10, desta vez menos pela técnica de sumir e mais pela capacidade de improvisar, de criar.

Nada mais interessa.

Ou não?


BACKDOOR MASTERS
Na sua última grande entrevista, Andy diz que sem Bruce, Dusty é seu grande companheiro no Tour e vai mais longe, diz que quando está inspirado, Dusty é capaz de tudo.

Com a corda no pescoço, Dusty Payne precisa varar pelo menos 3 baterias para se manter entre os top 32. Kiron Jabour e Saca foram suas primeiras vítimas.

Faz uma das 5 melhores baterias de 2010 contra Fanning e foi generosamente bem julgado.

Sem Pipeline quebrando por quase um mês, todo o Pipeline Masters em homenagem ao Andy Irons foi realizado no Backdoor.

Kieran Perrow e Jeremy Flores chegaram à final numa série inacreditável de viradas no último minuto.

Slater fez um 10.

Jeremy virou em cima de Kieran.

Pela primeira vez um europeu vence no Havaí.

Flores passa Adriano no ranking e quase o empurra pra fora dos top 10.

Owen chega até às quartas e rouba o rookie of the year do Jadson também no último minuto.

Slater ganha seu enésimo Surfer Poll, desta vez com a cerimônia lá mesmo no Havaí ─ Dane Reynolds rouba a cena com o discurso do ano.


ENCONTRO INADIÁVEL
Julian, Raoni, Heitor, Kerrzy e Alejo são os novatos da turma de 2011.

Comeram pedra para entrar no mais difícil ano da história da ASP.

Heitor, Raoni e Josh Kerr já estiveram por lá.

Raoni chegou cedo demais (2004), Kerrzy talvez um pouco tarde (2007), Heitor é um batalhador sério e concentrado.

Talento por talento talvez Raoni seja o melhor deles todos. O problema é que talento puro nunca foi suficiente para um título mundial.

Nem Slater, nem Curren, nem Andy, nem Carroll fiaram-se apenas no talento.

E vendo Alejo evoluindo como temos visto é de se esperar boas surpresas.

Julian Wilson tem o poder da mídia o empurrando e fez uma temporada havaiana brilhante mas, na minha opinião será Alejo que fará mais barulho.

Como diria o Pablo, ninguém é mais criança.


KING KELLY E SEU CORTEJO
O futuro do surfe profissional está nas mãos de um senhor de 40 anos de idade.

Apesar de toda fortuna que se gasta com os novos talentos como os alardeados 1.5 milhões de Verdinhas ao Jordy ou o milhãozinho do Julian Wilson, quem manda nessa joça e dita o ritmo é Slater.

Se hoje existe interesse nos campeonatos como jamais houve, a culpa é exclusiva do Careca.

É ele, e apenas ele, que todos querem desafiar, é ele que todos desejam destronar.

Sem Andy no circuito para afrontar Slater com desaforos dentro e fora d’água, resta saber quem vai se apresentar peitando o campeão dos campeões.

Mick é o que tem melhor retrospecto contra ele e pode vencê-lo em quase qualquer situação.

Parko tem fogo, falta-lhe a sorte.

Taj já mostrou que não tem fôlego para uma temporada inteira, a pressão pesa muito nos seus ombros.

Bede é um devorador de pecados, você erra e ele te engole, seria ele capaz de transformar-se num dominador? Não creio.

Mineiro não tem medo do lobo mau Slater, peca, no entanto, por não ser capaz de superá-lo em qualquer condição, Pipe ou França como Andy fazia e os dois sabem muito bem disso.

Owen Wright em todas credenciais para dar o passo à frente. Tem a frieza do Damien Hardman, a explosão e criatividade do Pottz, competitividade do Mark Richards, versatilidade do próprio Slater e entuba bem pros dois lados, falha que infelizmente Taj, Mick, Parko e Jordy tem em comum.

Dane ainda não despertou seu animal competitivo que dorme dentro dele e é pouco provável que se interesse no título tão cedo, mesmo assim é o único sujeito capaz de surpreender qualquer a qualquer momento.

Ninguém desconfia dos planos do Slater para 2011, mas algumas coisas são certas.

Ele estará na primeira etapa, e todos outros 3 Quik Pro e se tudo lhe correr bem... bem, vocês já conhecem essa história.