MARQUINHO FANHO


Mick Fanning não se chamaria Mick Fanning. Mick Fanning seria Marquinho Fanho. Um nome muito mais de acordo com sua nova personalidade porque ele não seria mais aquele bem apresentado, educado e formidável atleta que nós conhecemos como Mick Fanning. Ele também não seria mais um dos melhores surfistas do mundo. Até porque o Superbank, aquela verdadeira orgia de direitas perfeitas, também não existiria mais. Assim, ele não teria como refinar seu estilo e repertório de manobras em paredes longas e lisas. O Superbank não existiria porque a dragagem do rio Tweed teria sido um fracasso retumbante. E por isso o banco de areia mais perfeito do mundo, que iria de Snapper Rocks até Kirra, simplesmente não existiria.

Os políticos teriam inaugurado a tal obra de dragagem inúmeras vezes, e essa mesma obra seria com certeza muitas vezes superfaturada. E o prefeito, dois ou três secretários, e mais um monte de políticos estariam envolvidos até o pescoço no desvio dos recursos públicos para suas contas bancárias. Suas fotos estariam estampadas nos jornais, e o texto publicado comprovaria o esquema do “propinoduto” passo a passo. Mas, lógico, negariam tudo na maior cara de pau e nunca iriam presos. Se até o presidente e os seus “aloparados” poderiam roubar escancaradamente por que não o resto da cambada? Aliás, o presidente seria um quase analfabeto e faria besteira atrás de besteira, e mesmo assim a população o aprovaria maciçamente, pois sua conversa de botequim seria muito agradável.

Fanho pegaria umas ondinhas e morreria de ódio de malandrinho de fora, que ele chamaria de haole. Chamaria, não. Gritaria. “FORA HAOLE!!”. Seu passatempo predileto. Marquinho seria o famoso líder da gangue, e conhecido como o “local” mais marrento do pedaço. Ele se sentiria o máximo pichando as pedras e reinando sozinho na poluída praia de Esnápio. Como o governo também não se importaria com esgoto, o rio Tweed em nada se pareceria com o verdadeiro rio Tweed de águas límpidas e cristalinas, e dele jorraria merda 24 horas por dia. Mas Fanho e seus amigos nem se importariam. Reclamar por que, se o barraco deles seria bem de frente ao mar? Maior visual. Sua favela formaria um complexo com a da praia de Duranga, outro gueto violento e imundo. O resto da população, mesmo a não favelada, teoricamente mais educada, também não ligaria muito para a situação, pois teria coisas muito mais importantes para se dedicar, como Big Brother e novelas. Livros também não leriam, até porque educação não seria muito importante e as escolas estariam todas caindo aos pedaços.

E Gold Coast não seria o nome da região, mas de um luxuoso e horrível prédio com esquadrias de alumínio e vidro fumê, onde morariam o prefeito, dois jogadores de futebol, uma cantora de axé e vários empresários com fotos em coluna social. O fato de a praia em frente estar na sombra depois das duas da tarde por causa do prédio, e completamente poluída, não incomodaria ninguém.

Com certeza a Austrália, que talvez não se chamasse Austrália, teria estado na rota do tráfico de escravos. Milhões deles teriam sido “importados” da África para as fazendas para que seus senhores pudessem fingir que trabalhavam. A população também seria muito mais miscigenada do que a atual. Os caras não iriam aliviar as mulheres aborígenes de jeito nenhum. Sem falar nas lindas negras. Africana, com “aborigena”, com latino. Com certeza fariam um puta som com muita batucada.

Quiksilver e Billabong também não existiriam. Quer dizer, existiriam, mas não teriam sido criadas ali. Os surfistas empresários teriam a brilhante idéia de piratear as verdadeiras Quiksilver e Billabong, assim como Op, Town and Country, Lightning Bolt e outras. Daria muito menos trabalho. Fanho seria patrocinado por uma dessas marcas porque o big boss acharia o máximo poder surfar sem crowd no pico favela de Esnápio. Ele também seria o maior cabo eleitoral de um certo político safado que se diria representante dos surfistas, mas que só legislaria em causa própria. Em troca, o político ficaria lhe devendo alguns favores. “Tá tudo dominado”, ele pensaria sorrindo, alheio ao desastre de país que ele estaria ajudando a construir.

De brincadeira, eu fui pintando esse quadro para os australianos reunidos em volta da mesa, depois do jantar, nessa trip que fiz. Eles me olhavam atônitos tentando fazer sentido das minhas palavras. Mas era impossível. Os caras não precisam pensar em política ou economia. O governo e a população educada fazem tudo por eles. São muito mimados, mal acostumados, não compreendem um país todo feito para dar errado como o nosso. E por isso não havia jeito de entenderem a nossa bizarra realidade. Eu brincava que eles deram sorte por não ter sido colonizado pelos portugueses, que se tivessem sido, a Austrália seria uma enorme favela, como são todas as ex-colônias portuguesas ─ Angola, Moçambique e Timor. E o nosso querido Brasil, lógico.

Mas o mais engraçado foi ler recentemente a notícia de que documentos comprovam que a Austrália foi, na verdade, descoberta pelos portugueses. Isso mesmo, quase que a Austrália foi portuguesa porque os lusitanos, excelentes navegadores que eram, chegaram à costa australiana em 1522, portanto 250 anos antes do inglês Captain Cook, seu descobridor oficial. Mapearam tudo, mas acabaram não ficando. O autor da descoberta, o australiano Peter Trickett, escreveu um livro chamado “Beyond Capricorn” sobre esse episódio. Ele brincou que se os portugueses tivessem permanecido, os australianos falariam hoje português e jogariam um futebol melhor. Já eu pensei na hora que se a colonização tivesse sido mesmo portuguesa, Mick Fanning seria Marquinho Fanho e a Austrália seria o Brasil. Para tristeza dos australianos, que teriam que surfar no mar de lama diário da nossa política corrupta. Mas pelo menos no Brasil finalmente daria altas ondas. Não chega a ser um consolo, mas já é alguma coisa.

10 perguntas para... Joel Parkinson

SE VOCÊ ESTÁ COM O SURF EM DIA ─ AS NOTÍCIAS DO SURF, QUERO DIZER ─, JÁ DEVE SABER QUE O SEMPRE CANDIDATO AO TÍTULO MUNDIAL, JOEL PARKINSON, SOFREU UM PROFUNDO CORTE NO PÉ DURANTE UM FREESURF EM SNAPPER ROCKS, AUSTRÁLIA, RECENTEMENTE. DEPOIS DA ÚLTIMA RODADA DE CIRURGIAS E ALGUMAS SEMANAS NO SOFÁ, A PREVISÃO PARA SUA VOLTA É... NÃO MUITO ANIMADORA. O PRÓPRIO EXPLICA.

01. QUAL É A SITUAÇÃO DA CONTUSÃO?
Bom, o corte foi bem feio. Mas o problema realmente é o fato de eu ter cortado o músculo que segura o arco do meu pé e o tendão atrás dele, o que segura todos os dedos em linha. Basicamente cortei esse tendão e o músculo, meu calcanhar estava dividido em dois. Essa é a parte que vai demorar mais para sarar.

02. A FOTO PARECE TER SIDO TIRADA DE UM MANUAL DE PRIMEIROS SOCORROS.
Não é bonito. Mas o cirurgião ficou satisfeito com o modo como tudo ocorreu. O corte já está bem fechado, mas a parte difícil é que não posso me apoiar sobre ele por seis meses. Esse é o tempo que demorará para sarar, porque o corte atravessou o músculo e o tendão. Tudo tem que cicatrizar antes de eu voltar a andar.

03. ENTÃO, QUANTO TEMPO ATÉ VOCÊ VOLTAR A SURFAR?
O médico disse que eu não vou surfar até o dia 9 de outubro. Ele disse, “Vai parecer que você está pisando sobre agulhas e você não vai surfar bem, mas vai voltar para a água e em alguns meses já surfará sem dor”. Eu só estou torcendo para voltar até a Tríplice Coroa Havaiana. Se conseguir surfar no Hawaii, ficarei amarradão.

04. COMO NÃO ENLOUQUECER NESSA SITUAÇÃO?
Ah, é o dia-a-dia. Estabelecer pequenos novos objetivos todos os dias.

05. VOCÊ ESTÁ COM UM BEBÊ A CAMINHO, CERTO?
Sim, isso é um bônus. Entre ir atrás do título mundial ou ver meu bebê nascer, eu teria ido atrás do título. Já tinha aceitado essa idéia. Mas agora não vou a lugar nenhum. Isso é uma benção. Talvez seja o meu filho falando, “você não pode perder meu nascimento”. O fato de ele estar previsto para nascer no dia 10 de outubro e o médico falar que eu vou poder surfar no dia 9... Eu pensei, bom, isso é esquisito.

06. DESCREVA COMO TUDO ACONTECEU.
Eu estava no tubo e a foamball me pegou. Logo depois, ela me jogou para frente, então mergulhei junto. A quilha não me acertou com tanta força, só meio que passou raspando. Eu fiquei pensando, “uau, isso deve ter cortado”. Então passei a mão e os dedos entraram fundo no meu pé, porque o calcanhar estava pendurado para fora. Quando levantei a perna para ver, meu calcanhar estava cinco centímetros mais baixo do que o normal. Eu só disse “fuck off!”. Havia sangue saindo para todos os lados. Tomei as duas ondas seguintes na cabeça e fui parar na praia.

07. VOCÊ PENSA SOBRE A CONTUSÃO DE MICK, QUE O AJUDOU A VOLTAR E GANHAR O TÍTULO MUNDIAL?
É, tenho pensado. A sensação de estar imobilizado é horrível. É como se eu ainda tivesse que passar por muita dor antes de voltar a surfar. Então penso, “Mick conseguiu, então também vou conseguir”. Mas porra, depois de tudo que me aconteceu no ano passado, será que eu já não passei pelo suficiente?

08. É HORRÍVEL PERDER ESSE EMBALO DE NOVO.
Cara, eu estava me sentindo tão bem! Estava em forma. Eu quase comecei a parar um pouco de treinar para me focar apenas nas baterias. Não me cansava de surfar. Estava meio que possuído nos últimos meses, só buscando um bom resultado. E foi tudo por água abaixo.

09. NADA É POR ACASO.
Nada é por acaso.

10. O QUE ESTÁ PASSANDO NA TV?
Estou vendo futebol. É praticamente a única coisa que consigo fazer.

10 É POUCO


Fui pra Huntington só pra ver o Kelly surfar”, me disse uma amiga que acabava de voltar da Califórnia.

Apesar de culta e inteligente, ela não entende nada de surf — é daquelas pessoas que pergunta se parafina se passa no fundo ou no deck da prancha. Mas mesmo assim, tirou um dia de sua viagem para assistir o melhor de todos os tempos surfar umas merrecas perante uma praia lotada.

Na hora torci o nariz como quem diz: “o surf é muito mais que o Kelly, sabia?”. Mas aquele era apenas mais um exemplo do apelo e carisma do nosso maior campeão.

Só Slater tem esse poder.

Só ele é reconhecido pelas grandes massas estranhas ao surf. Só ele saiu na lista da People Magazine. Só ele pegou a Gisele e a Pamela. Só ele fez filme em 3D e participou do SOS Malibu. Caramba, até minha avó sabe quem é o cara!

É como se para o universo mainstream, ele fosse maior que o surf.

Claro que a imagem de bom moço ajuda. O discurso sempre politicamente correto também. Slater teve uma carreira livre de controvérsias e escândalos e isso vende bem.

Mas a reputação exemplar e as namoradas famosas não fazem tudo sozinhas.

Slater é quem é por ser O Campeão. Porque ganha tudo. Porque está com quatro dedos na taça que marcará seu décimo título mundial. Porque, mesmo aos 38 anos de idade, é o surfista mais completo e versátil do planeta.

Mas também não é só isso.

Slater tornou-se o Maior de Todos os Tempos, principalmente, pois Oe o cara que sempre surpreende.

É ele quem bota pra dentro em Waimea. Ou ganha o Pipe Masters com uma 5’6”. Ou abre uma brecha dentro do tubo em Teahupoo.

Kelly tem mais do que uma carreira valiosa. Sua trajetória é marcada por uma sucessão de feitos surpreendentes.

E é por saber disso que pretendo não cometer o mesmo erro de 2008 — quando Kelly venceu o 9º título mundial. Na ocasião, escrevi que muito provavelmente era a última vez que o veríamos competindo em tempo integral. Já havia feito o mesmo em 2006 — quando ele levou o 8º caneco — e em 2005, quando levou o 7º. Na época ninguém imaginava que alguns anos mais tarde ele ainda estaria dando trabalho — e vencendo — no WT.

Tudo indica que, se vencer em 2010, ele irá aposentar-se das competições de uma vez por todas.

Mas esse filme eu já vi antes. Desta vez não vou deixar o careca me surpreender. Pois se a história é um indicativo, 10 títulos mundiais é pouco.

Com saúde e surf de sobra, Kelly tem tudo para continuar surpreendendo e, já quarentão, brigar pelo título número 11, 12, 13...

Alguém duvida?

Hurley Pro Trestles 2010

KELLY SLATER BATE BEDE DURBIDGE NA FINAL DO HURLEY PRO TRESTLES, ASSUME A LIDERANÇA DO RANKING E PARTE COM TUDO EM BUSCA DO DÉCIMO TÍTULO MUNDIAL. A SEXTA ETAPA DO ASP WORLD TOUR, REALIZADA EM SETEMBRO NA CALIFÓRNIA, TAMBÉM MARCOU A ESTRÉIA DO NOVO FORMATO DO CIRCUITO MUNDIAL.



Os amantes do esporte jamais esquecerão a etapa do World Tour em Trestles deste ano. Mais uma vez, o pico ofereceu ondas perfeitas para performances espetaculares dos melhores surfistas do mundo. Nomes da nova geração como Jordy Smith, Dane Reynolds e Owen Wright apresentaram um vasto repertório de manobras inovadoras e, além de levar a galera ao delírio, mostraram o rumo que o surf deverá tomar nos próximos anos. Os macacos velhos do Tour como Taj Burrow, Mick Fanning e Bede Durbidge não deixaram por menos e também fizeram grandes apresentações.

Numa etapa “espetacular” em todos os sentidos, nada mais natural que o número principal ficasse com o melhor surfista de todos os tempos, o americano Kelly Slater. Ele simplesmente atropelou os adversários com um surf fantástico para vencer pela quarta vez em Trestles ─ deixando claro que, mesmo aos 38 anos, ainda tem muita lenha para queimar.

Normalmente, Slater é um adversário difícil de ser batido em qualquer condição. Ainda mais em Trestles, uma de suas etapas preferidas, com uma multidão na praia torcendo por ele, louco para assumir a liderança do ranking e partir definitivamente em busca do tão sonhado décimo título. O ídolo não decepcionou e mostrou que pode vencer qualquer um em qualquer condição.

Kelly começou vencendo sem problemas o australiano Luke Stedman e o jovem Kolohe Andino, um dos convidados da etapa. No terceiro round, eliminou sem dificuldades o compatriota Gabe Kling. Porém, na quarta fase, mesmo surfando bem, ficou em segundo lugar na bateria vencida pela sensação australiana Owen Wright, que já o havia derrotado na etapa de Bell’s de 2009. Kelly liderava a disputa até que, a poucos minutos do término, Owen pegou uma bela direita, mandou várias batidas fortes e finalizou com um aéreo, para receber 9,63 dos juízes e mandar Kelly e CJ Hobgood para o quinto round ─ que só foi para a água no último dia do prazo. No dia decisivo, os competidores foram premiados com ondas perfeitas de até 1,5 metro. Mesmo com tudo a seu favor, Kelly ainda ganhou um bônus que só favoreceu sua escalada rumo ao título. Seu adversário na quinta fase, o australiano Chris Davidson, não apareceu para a disputa por estar doente (com uma forte febre), e Slater teve todas as atenções e ondas só para ele, do jeito que gosta.

Sozinho no outside e com ondas incríveis à sua disposição, o nove vezes campeão do mundo proporcionou um verdadeiro espetáculo aos espectadores, aquecendo as quilhas e recuperando a confiança após a derrota do dia anterior. Nas quartas, ele teve de enfrentar novamente Owen. Mas dessa vez deu o troco, mesmo com o aussie pegando a melhor onda da bateria ─ em que mandou um aéreo 360°, seguido de uma boa manobra na junção, e recebeu 9,20, nota insuficiente para superar Slater, que tinha 9,10 e 7,93. Ainda pelas quartas, o até então líder do ranking, Jordy Smith, que havia passado por todas as baterias com notas altas, não conseguiu repetir as apresentações e foi barrado. O sul-africano errou muito e perdeu o duelo para Bede Durbidge, deixando o caminho livre para Slater assumir a liderança.

Na outra chave, Dane e Taj travaram um duelo eletrizante em busca de uma vaga na semifinal. Eles vinham sendo apontados como favoritos ao título devido às belas performances em rounds anteriores.

O australiano começou melhor, com um 8,90, mas não conseguiu achar uma segunda nota boa. Dane, por sua vez, abusou dos aéreos, sua marca registrada, e carimbou a classificação. Na primeira semi, Kelly e o atual campeão do mundo, Mick Fanning, voltaram a se enfrentar depois da final em Bell’s. Mais uma vez, quem se deu bem foi Slater, que abriu o duelo com 8,87 e deixou o australiano em combinação durante boa parte da disputa. Mick ainda tentou responder com um 7,93 numa direita, mas foi só. Na outra disputa, Bede surpreendeu e despachou Dane Reynolds, que não se encontrou na bateria e cometeu muitos erros. Estava selada a reedição da final da etapa em 2006, em que Bede venceu Kelly para conquistar sua primeira vitória no Tour.

Desta vez, no entanto, o americano não deixou a peteca cair. Em sua melhor onda, Kelly achou um belo tubo e ainda finalizou com boas manobras. Sob gritos da galera, recebeu 9,53, papou o título e assumiu a liderança do ranking: “Olhando para trás, nunca teria sonhado com o nono título, muito menos um décimo. Não sei o que dizer. Ainda há um longo caminho pela frente. Temos mais quatro eventos. Agora quero apenas curtir a vitória”, disse Kelly, que embolsou US$ 105 mil e 10.000 pontos no ranking ─ somando 43 vitórias no World Tour na carreira.


OS BRASILEIROS

Depois do corte de 45 para 32 surfistas promovido em Teahupoo, o paulista Adriano de Souza e o potiguar Jadson André são os únicos representantes brasileiros no Tour. Ambos tiveram uma trajetória parecida em Trestles, avançando direto para a terceira fase com excelentes desempenhos ─ principalmente Jadson, autor de somatórios expressivos. O potiguar abusou dos aéreos de frontside e mandou o americano CJ Hobgood e o havaiano Dusty Payne para a repescagem.

Na terceira fase, porém, a dupla brazuca não conseguiu repetir as boas atuações. O primeiro a dar adeus foi Adriano de Souza, surpreendentemente barrado pelo australiano Kieren Perrow. Mineirinho pecou na escolha de ondas e não mostrou todo seu potencial. Mesmo assim, em sua melhor onda ele recebeu apenas 6,77 ─ nota que poderia ter sido melhor avaliada pelos juízes.

Nos últimos instantes, Mineiro ainda tentou a virada, mas obteve somente 5,77, quando precisava de 6,37. Depois de uma incrível performance de Jadson na primeira fase, todos queriam ver o que o campeão da etapa brasileira do WT poderia fazer. Novamente o potiguar abusou dos aéreos de frontside, mas limitou-se a fazer apenas isso na bateria. Alguns dos seus aéreos até mereciam um julgamento melhor, mas o resultado acabou sendo justo.

Jadson insistiu em buscar as esquerdas, quando as direitas eram visivelmente as melhores opções. Tanto que sua melhor nota na bateria foi justamente numa das pouquíssimas direitas que pegou. Damien, por sua vez, optou pelo melhor caminho e, manobrando com muita força de backside, ficou com a vitória.


NOVO FORMATO

A etapa de Trestles também foi marcada pela estréia do novo formato de disputas. Se no papel o modelo não havia agradado muita gente, na prática acabou funcionando bem e foi elogiado pela maioria. Com menos gente no Tour, os melhores do mundo se enfrentaram mais vezes, alongando o show para o público. “O novo formato é bom para os fãs. Eles têm a chance de nos ver surfar mais. Além disso, mudou a minha forma de competir. Na quarta fase, por exemplo, eu estava me divertindo e apenas na metade da bateria me dei conta de que estava competindo. Fui muito mal. Se você vence, ganha uma fase de descanso. Se perde, surfa de novo. Acho que no geral foi bom”, comentou Slater.

Quanto vale o show?

TAMANHO É DOCUMENTO
O recorde da maior morra surfada até hoje — 70 pés, em Jaws, Hawaii — é do havaiano de 43 anos Pete Cabrinha. Cada pé equivale a 0,305 metro. Assim, a altura da onda surfada por ele alcançou cerca de 22 metros. Se nos colocarmos embaixo de um prédio de oito andares e imaginarmos que ele poderia estar em movimento, daria para ter uma idéia do quanto aterrorizante é ficar com um monstro desses na sua cola.

VELOCIDADE
Em média, a velocidade de propagação de uma onda em alto-mar é de 70 km/h. Se imaginarmos que, na maior parte das ondas gigantes, o swell encontra uma bancada que repentinamente freia seu movimento, pode-se considerar que a onda perde até 50% da sua velocidade antes de quebrar. Assim, o surf acontece sobre uma onda à cerca de 40 km/h. Não parece muita coisa. Mais interessante é notar a velocidade que o surfista pode atingir: 70 km/h! Se segura!

POTÊNCIA
Segundo o oceanógrafo Valdir Innocentini, a potência de uma onda gigante com cerca de 500 metros de comprimento e período de 20 segundos será algo em torno de 1 trilhão de joules, o que daria 15 trilhões de watts ou 15.000 megawatts de potência. Se você não faz idéia do que significa isso, saca só: a usina de Itaipu, a maior hidrelétrica do mundo, tem uma potência instalada de 12.600 megawatts. Assim, uma onda gigante em Jaws possui uma potência 20% maior do que uma Itaipu inteira. É energia para big rider nenhum botar defeito!

SHAPE INTERATIVO


Já pensou em acompanhar sua prancha sendo shapeada direto de casa? Agora isso é possível. Ao encomendar uma prancha na fábrica da Silver Surf, você terá acesso a uma câmera instalada dentro da sala de shapes, poderá assistir como andam os trabalhos no seu novo brinquedo e até dar palpites durante o processo pelo computador.

Localizada em Santos, a Silver Surf foi criada há mais de 12 anos pelos irmãos, shapers e surfistas Sylvio Oliveira e Adriano Oliveira e já é uma das marcas mais conceituadas no país.

Dando ao surfista a oportunidade de assistir aos trabalhos feitos em sua nova prancha, o pessoal da Silver Surf pretende criar um vinculo maior com seus clientes e expor o trabalho de sua equipe. “Tivemos essa idéia porque nos preocupamos em fazer um atendimento diferenciado para nossos clientes e, sempre que alguém encomenda uma prancha aqui, nós fazemos questão de mostrar como funciona o processo de fabricação e com isso vemos que as pessoas têm bastante curiosidade em saber como esse processo é realizado”, disse Sylvio, um dos donos da fábrica. Segundo ele, o feedback que a equipe tem recebido das primeiras exibições foi bem positivo.

Por enquanto, só quem fez a encomenda pode assistir ao que rola na sala de shapes, mas em determinados dias ou durante a realização de um shape especial, a Silver Surf irá liberar o acesso da câmera em seu site. “Neste mês, vamos shapear uma prancha para o nosso atleta Rodrigo Sino. Ele estará na sala de shape com a gente e quem quiser assistir terá o acesso liberado”.

Menino do Rio

Clássico do cinema nacional e, porque não dizer, do cinema surf dos anos 80, Menino do Rio pode ser considerado não só um filme que marcou época, mas um filme que influenciou o comportamento de toda uma geração.

Menino do Rio
é inspirado na canção homônima que alçou a então iniciante Baby Consuelo ao estrelato, a suave composição de Caetano Veloso, que por sua vez, inspirou-se no garoto boa-praça Petit, figura fácil nas areias do Arpoador e, no seu auge, símbolo do astral único do carioca que vive à beira-mar.

A produção tem cheiro de mar, de maresia, juventude e inocência e, pioneira, trouxe a proposta de levar os jovens brasileiros para o cinema. A história é defendida pelo ator André de Biase (o menino do título e também co-autor do filme, dirigido por Antônio Calmon), um conto de amor improvável, que mostra o universo de Ipanema, do Arpoador e do Píer nos anos 80 que até então o país desconhecia. “O Brasil não conhecia um filme para jovens, não conhecia a maneira de viver que os surfistas do Rio levavam, não conhecia o surf. Menino do Rio mostrou uma energia única que era vivida na pureza do Rio”, diz o conhecido ‘Lula’, que graças ao sucesso do filme, assistido por 3 milhões de pessoas, recorde de bilheteria para a época, estrelou a famosa série de televisão Armação Ilimitada, e até hoje, aos 53 anos de idade, ainda é reconhecido como o menino do rio. “Certa vez, tive o prazer de encontrar em um restaurante o Ayrton Senna, que veio direto em minha direção para me cumprimentar e falar que sempre tomava suco de mamão com laranja por minha causa, por causa desse filme”, conta de forma saudosa André de Biase, que evidencia o orgulho de ser lembrado por um filme tão simplório, porém que mudou uma realidade.

Menino do Rio é um filme imperdível para os amantes da vida na praia, do surf. Para entender o que acontecia nas praias do Rio no verão de 1982, conceba o Menino do Rio.

ELES DÃO AS CARTAS LÁ DENTRO


Assistindo às etapas de Jeffrey’s Bay e Teahupoo deste ano, reparei numa coisa bem peculiar. Não sei se foi impressão minha, mas será que os surfistas goofy footers (que surfam com o pé direito na frente) têm a mesma técnica de entubar de backside dos regular footers (surfam com o pé esquerdo na frente)?

Vamos aos fatos: na minha opinião, os melhores tube riders de backside do planeta são Kelly Slater e os irmãos Irons. Os três regular e destacam-se sempre que as ondas são tubulares para a esquerda, como Pipeline e Teahupoo. O trio tem nada menos do que dez títulos em Pipe (cinco de Kelly, quatro de Andy e um de Bruce), além de seis vitórias nas cascudas canhotas do Tahiti (quatro de Slater e duas de Andy).

Analisando com mais atenção, cheguei à conclusão de que os surfistas regular footers têm a base um pouco mais aberta, o que favorece a técnica de entubar de grab rail, proporcionando um agachamento mais equilibrado. Os goofy footers, por sua vez, têm uma base mais fechada, o que impede a mesma posição na hora de passar pelos canudos. Você se lembra de algum tubaço de backside no Backdoor? Já vi vários bons tubos de goofy footers por lá, mas nunca como os completados em Pipe por Jamie O’Brien, Kelly, os irmãos Irons e até Michael Ho, um dos primeiros a executar com maestria o grab rail.

Pensei também na hipótese de que às direitas teriam uma formação um pouco menos buraco que as esquerdas, mas depois de ver um DVD com os tubos em Barra de La Cruz, no Rip Curl The Search realizado em 2006 com a presença dos melhores surfistas do mundo numa das direitas mais tubulares já registradas, me convenci de que o problema é mesmo na maneira de pisar dos surfistas.

Sendo assim, fica até mais fácil entender o porquê de os regular footers estarem dominando o Circuito Mundial. Alguns podem até dizer que este domínio deve-se ao fator Kelly e Andy, ganhadores de 12 títulos mundiais nos últimos 18 anos, mas não há como esquecer que Fanning, Taj, Parko, Andy e Kelly levam muita vantagem sobre o resto da turma atualmente. Afinal, eles entubam como poucos para a direita, e têm facilidade para se entocarem fundo para a esquerda. Sim, os tubos, mesmo nesta época de aéreos e truques, continuam sendo a manobra mais pontuada.

Você pode até não concordar com a minha tese maluca, mas com certeza terá que aceitar que os dois tipos de surfistas não entubam da mesma forma de backside. Até penso que a maioria dos goofy footers tem imensa dificuldade de equilibrar a técnica para os dois lados. Um exemplo: Renan Rocha e Bruno Santos, dois exímios tube riders para a esquerda, não possuem o mesmo nível para a direita. Já Bernardo Pigmeu, para mim o brasileiro melhor nos tubos, domina com louvor a técnica de se entocar para ambos os lados.

Não fiquem tristes, goofy footers. Afinal de contas, vocês têm inúmeros mestres nos tubos como Gerry Lopez, Rory Russell, Derek Ho, irmãos Hobgood, todos monstros para a esquerda. Só deram azar de que nos últimos anos um garoto da Flórida e dois marrentos do Kauai resolveram revolucionar a forma de entubar de costas para a onda.

Billabong Pro Tahiti 2010

ANDY IRONS BATE KELLY SLATER NA SEMIFINAL E C.J. HOBGOOD NA DECISÃO DO BILLABONG PRO TAHITI, E AFIRMA: “ESTOU DE VOLTA”. A QUINTA ETAPA DO ASP WORLD TOUR, DISPUTADA EM TEAHUPOO, DEFINIU O CORTE DE 45 PARA 32 ATLETAS QUE INICIA UMA NOVA ERA NO CIRCUITO.


Eu voltei, agora pra ficar, porque aqui, aqui é o meu lugar...”. O refrão da música “O Portão”, do Roberto Carlos, cai como uma luva para ilustrar, sonoramente, o retorno de Andy Irons ao Circuito Mundial. Depois de muitas dúvidas e especulações sobre seu retorno, o havaiano tricampeão mundial (2002/03/04) deu a volta por cima e mostrou ao mundo que seu lugar é entre os Tops, disputando títulos.

A vitória não poderia vir em hora melhor, já que muitos duvidavam de seu retorno devido às fracas atuações nas quatro primeiras etapas ─ finalizando em 17º, 9º, 33º e 9º.

O local do Kauai, que agora parece estar mais humilde, reencontrou o caminho da vitória mostrando um pouco da genialidade do passado ─ embora as condições tenham deixado a desejar, já que o campeonato só começou no oitavo dia de janela e nem de longe mostrou o potencial que a bancada de Teahupoo possui.

Logo na primeira fase aconteceu o duelo que marcou a história recente dos campeonatos de surf: Kelly e Andy voltaram a se enfrentar depois de quase quatro anos (a última vez havia sido na final do Pipe Masters de 2006, com vitória do havaiano). O taitiano Heiarii Williams completou a disputa. Slater começou melhor, com 6,5 e 7,5. Heiarii ainda tentou roubar a cena com um 8,17, melhor nota da bateria. No meio do confronto, Andy acordou e tirou um 6. Ficou precisando de 8 para assumir a liderança. A oito minutos do fim, o tricampeão pegou um belo tubo, mas recebeu apenas 7,97 e perdeu por uma diferença de 0,03 para o rival.

Apesar da derrota, Andy não se abateu e foi para a repescagem com fome de vitória. Sobrou para o americano Tanner Gudauskas, que terminou em combinação contra ele. Na terceira fase, com poucas ondas, Andy venceu um duelo apertado contra o australiano Matt Wilkinson.

As oitavas de final foram para a água apenas no último dia da janela de espera. O mar reagiu e bons tubos começaram a aparecer, mesmo com o forte vento. E foi justamente nas oitavas que Andy encarou sua mais dura batalha, contra o bicampeão mundial Mick Fanning. O havaiano liderou a maior parte do confronto. A menos de dez minutos do fim o australiano conseguiu sair de uma combinação e virou a disputa. Mas Irons pegou uma onda salvadora, arrancou 6,50 dos juízes e faturou por uma diferença de 0,10. Nas quartas, Andy passou sem dificuldades pelo americano Patrick Gudauskas.

Na semifinal, ele voltou a cruzar com Kelly, que vinha de grandes atuações nas fases anteriores ─ na última bateria, ele inclusive tirou a única nota 10 do evento, além de obter o maior somatório. Se o americano vencesse, assumiria a liderança do ranking mundial. Provavelmente, Kelly teria vantagem psicológica sobre outros surfistas graças a esses fatores, mas não contra Andy. O desafio começou morno. Nenhum dos surfistas pegou boas ondas. A batalha esquentou quando o havaiano entubou uma onda do começo ao fim, relembrando o velho Andy e tirando 9,40. Kelly tentou reagir pegando algumas ondas, enquanto Andy ficou na espera de outra boa para tentar aumentar a diferença, mas o máximo que conseguiu foi um 4,17. Seu rival ficou precisando de 8,25, tarefa que poderia ser fácil, ainda mais vindo de performances incríveis em rounds anteriores ─ e na onda em que já tomou até cerveja dentro do tubo. Mas desta vez Kelly não achou a onda salvadora e o havaiano fez a festa.

Na final, Andy superou com tranqüilidade C.J. Hobgood, campeão mundial de 2001. Venceu por 14,67 a 8,33 e conquistou seu primeiro título após retornar ao Circuito (a última vitória dele tinha sido em 2007, no Chile). “Sinto que estou de volta. Meu sonho era ganhar um campeonato. Fiz isso e agora quero mais. Vencer em Teahupoo, minha onda favorita, torna tudo ainda mais especial”, disse o bicampeão em Teahupoo (a primeira vitória foi em 2002). Andy embolsou US$ 50 mil e levou 10.000 pontos no ranking.


OS BRASILEIROS
Mais uma vez, o melhor brasileiro foi Adriano de Souza, eliminado nas oitavas de final pelo amigo português Tiago Pires.

Mineirinho liderou a disputa a maior parte do tempo, mas Pires achou uma onda salvadora quase no final, arrancou 8,33 dos juízes e virou a bateria. O brasileiro mostrou que a cada ano se sente mais à vontade em Teahupoo. Na primeira fase, mesmo sem apresentar um bom desempenho, derrotou o americano Tim Reyes e o havaiano Roy Powers. No terceiro round, venceu um duelo equilibrado contra o francês Joan Duru.

Depois da vitória na etapa brasileira do Tour, muitos queriam ver como Jadson André se sairia em Teahupoo, ainda mais depois dos comentários de Kelly. Sua estréia no Tahiti, porém, não foi das melhores. Na primeira fase, não conseguiu se encontrar nas difíceis condições do mar e ficou na última colocação no duelo vencido pelo australiano Luke Stedman, com o americano Nate Yeomans em segundo. Na repescagem Jadson surfou melhor, mas mesmo assim perdeu para Yeomans. Vai precisar melhorar se quiser brigar de igual para igual com os melhores do Tour em Teahupoo.

Neco Padaratz e Marco Polo chegaram ao Tahiti precisando de um resultado expressivo, pois era a última chance de escaparem do temido corte do meio do ano, que ocorreu após a etapa de Teahupoo. Ambos perderam na primeira fase, sem apresentar um grande desempenho. Na repescagem, Neco não conseguiu se recuperar, mesmo pegando bons tubos. Jogou fora a chance da vitória ao cometer uma interferência boba, deixando o caminho livre para C.J. Hobgood. Neco é um surfista experiente, que já conquistou muitas glórias no Circuito Mundial, mas terá de reinventar seu surf para voltar à elite.

Já Marco Polo conseguiu uma vitória surpreendente sobre o americano bicampeão da etapa Bobby Martinez, seu primeiro e único trunfo em 2010. Só um excelente resultado poderia livrar a cara do catarinense. No entanto, o sonho de se manter na elite acabou no round seguinte, quando perdeu uma bateria muito disputada para o americano Damien Hobgood. Polo não teve um ano bom. Caiu quase sempre com os Tops do ranking por causa do seeding e venceu apenas uma bateria em cinco etapas ─ pouco para quem quer fazer parte da elite. Garra e dedicação ele tem de sobra. Agora, terá de voltar ao WQS, que conhece muito bem, para buscar novamente uma chance.


A LISTA
Com o término da etapa de Teahupoo, saiu a temida lista dos 13 surfistas que deram adeus ao Tour e terão que voltar à divisão de acesso. Os eliminados foram os brasileiros Marco Polo e Neco Padaratz; os australianos Mick Campbell, Kieren Perrow, Drew Courtney, Tom Whitaker, Dean Morrison, Jay Thompson, Blake Thornton e Bem Dunn; os americanos Nate Yeomans e Tanner Gudauskas; e o havaiano Kekoa Bacalso.

11 perguntas para... Stephan Figueiredo

NÃO É NOVIDADE QUE STEPHAN FIGUEIREDO TEM FOME DE TUBO. NOS ÚLTIMOS ANOS, ESTE CARIOCA DE FALA ARRASTADA E SORRISO FÁCIL CONSTRUIU ─ COM MUITO MÉRITO ─ UMA REPUTAÇÃO DE RESPEITO EM PIPELINE. ELE NÃO É APENAS UM DOS ÚNICOS BRASILEIROS A BATER CARTÃO TODA VEZ QUE PIPE QUEBRA GRANDE, MAS É TAMBÉM UM DOS “HAOLES” MAIS RESPEITADOS O LINE-UP MAIS INTENSO DO MUNDO. PARA FICAR PRÓXIMO DA RAINHA DO NORTH SHORE, FUN, COMO É CONHECIDO, RECENTEMENTE MUDOU-SE DE VEZ PARA O HAWAII, ONDE VIVE COM A NAMORADA. ELE NÃO ESCONDE A SAUDADE DO BRASIL, MAS GARANTE ESTAR SURFANDO AS ONDAS DE SUA VIDA. NUMA CONVERSA DESCONTRAÍDA, STEPHAN CONTA COMO É O DIA-A-DIA NO EPICENTRO DO SURF MUNDIAL.


01. QUANDO VOCÊ DECIDIU IR MORAR NO HAWAII?
Eu venho para o Hawaii há mais de dez anos e sempre fico meses aqui. Já fiquei dois, três, quatro e até cinco meses direto no Hawaii. Na última temporada, aqui foi na verdade meu ponto de partida para uma volta ao mundo. Eu tinha acertado com meus patrocinadores que passaria 2009 inteiro viajando, e já começaria direto do Hawaii, sem voltar ao Brasil. E naquela temporada de 2008/2009 conheci minha namorada, Camila. Ela é brasileira, mas mora aqui no Hawaii já faz um tempo. Então decidi ficar aqui, com ela. Decidi fazer daqui a minha base. Ou seja, continuo viajando durante o ano, mas ao invés de voltar ao Brasil, eu volto para cá. Faz mais sentido, eu já passava tanto tempo aqui mesmo.

02. E QUANTOS MESES POR ANO VOCÊ FICA NO NORTH SHORE?
É o mesmo esquema de quando eu morava no Brasil. Entre uma viagem e outra, sempre volto para cá. Durante a temporada havaiana inteira, estou aqui. Então se você for somar tudo, deve dar uns 6 ou 7 meses.

03. COMO ESTÁ SENDO A EXPERIÊNCIA AGORA?
Estou gostando da vida aqui. Sou um cara bem tranqüilo e aqui a vida é bem tranqüila também. Existe o problema do localismo, mas na verdade os locais todos já me conhecem. Eu tenho amizade com todo mundo e não tenho problema com ninguém. É só respeitar os caras, que os caras te respeitam. E minha vida não é muito diferente de como ela seria no Rio. Acordo, vou surfar, vou à academia, faço as coisas que tenho que fazer ─ mas faço aqui.

04. FORA O LOCALISMO, QUAL É O PONTO NEGATIVO DE VIVER AI? DO QUE VOCÊ SENTE MAIS FALTA?
O que mais me faz falta é surfar em frente de casa com os amigos. Isso é o que eu mais sinto falta. Estou aqui mais pelo lado profissional, entende? É muito importante pra minha carreira estar aqui. Se ficar no Brasil, eu não vou mudar, não vou sair daquilo. E aqui é um passo importante pra minha carreira. Então vir pra cá é uma decisão profissional mesmo. Não é uma coisa de “tenho um sonho de viver no Hawaii”, não é isso. Sou um cara que adora estar com os amigos e com a família. Aqui tem altas ondas, a vida é boa e também tenho alguns amigos, tenho minha namorada. Mas não é como estar no Brasil, estar com meus amigos e poder curtir.

05. E QUAL É O PONTO POSITIVO?
O melhor aqui são sem dúvida as ondas. A quantidade de ondas boas é bem maior e é muito mais constante. Vivendo aqui eu vou estar sempre mais preparado do que se estivesse no Brasil. Enquanto lá eu vou surfar ondas grandes apenas algumas vezes por ano, aqui tenho a temporada inteira. Também faço trabalho físico quando não tem onda. Vou à academia, faço natação, mergulho, um monte de coisas.

06. VOCÊ ACHA QUE TER UMA NAMORADA BRASILEIRA AMENIZA A SAUDADE DO BRASIL?
Ameniza um pouco. Ameniza um pouco. Mas o que mais me falta mesmo são os amigos. Surfar em frente de casa com os amigos é a melhor coisa do mundo. Mas na temporada muitos deles vêm pra cá. Só sinto falta mesmo durante o ano. Quando estou aqui no meio do ano, felizão, tranqüilo com a minha mina, a única coisa que me falta são os amigos. Mas aí quando estou lá no Brasil falta outra coisa, e eu fico pensando nas ondas (risos).

07. COMO SUA FAMÍLIA ENCAROU A MUDANÇA?
Eles estão contentes por mim. Minha mãe reclama que não me vê faz um tempão (risos) ─ eu tenho viajado muito. Mas meu pai está amarradão, está me dando muito apoio. Toda minha família me apóia e eles estão felizes com a minha decisão.

08. O QUE É UM DIA NORMAL NO NORTH SHORE?
Antes de dormir eu checo todas as previsões de tempo e swell, então já sei mais ou menos o que esperar na manhã seguinte. Se eu sei que vai estar grande, vai ter onda boa, madrugo e antes do amanhecer já estou na praia. Mas normalmente eu acordo lá pelas 7 da manhã, dou uma checada nas ondas e vou para o surf na hora que sai o sol. Porque pô, nesses dez anos o que eu mais fiz foi surfar de madrugada pra fugir do crowd (risos). Agora não está tão fácil levantar muito cedo, ainda mais com uma namorada em casa (risos).

09. E FORA DO SURF, O QUE MAIS DE MANEIRO TEM PRA FAZER AQUI? VOCÊ TEM UMA HARLEY-DAVIDSON, NÃO É?
Sempre gostei de moto. Meu irmão tem moto no Brasil. E meu sonho era ter uma moto irada. Como aqui tudo é mais acessível, as coisas são mais baratas, pintou a oportunidade de comprar aquela moto e não pensei duas vezes. E nem carro eu tenho! Só uso o da minha namorada de vez em quando. Vou surfar de bicicleta e vou pra academia de bicicleta. Mas eu tinha que ter aquela moto (risos).

10. MUDANDO DE ASSUNTO, NESTA TEMPORADA FICOU EVIDENTE QUE UMA NOVA LEVA DE SURFISTAS DO BRASIL ESTÁ DETERMINADA A SURFAR PIPE TODA VEZ QUE O MAR CRESCE ─ ALGO QUE A MAIORIA DOS SURFISTAS DAS GERAÇÕES ANTERIORES NÃO FAZIA. COMO VOCÊ VÊ ESSA MUDANÇA DE ATITUDE?
Eu acho que o surfista brasileiro tem talento suficiente para surfar as ondas daqui. O que falta é um pouco mais de profissionalismo por parte dos surfistas mesmo. Porque você vai encontrar dificuldades em qualquer coisa que for fazer na vida. E aqui é o lugar onde você terá mais dificuldades de surfar, de descer a da série. Mas se quer se destacar mesmo, tem que superar as barreiras. Tem que estar pronto pra encarar essas dificuldades, ou nem ligar pra elas, por amor aos tubos mesmo. Por isso eu acho que muitos caras não surfam Pipe com tanta vontade. Porque se você não tem prazer, mas aquele é seu trabalho, sua obrigação, você vai fazer. Mas vai fazer de qualquer jeito, por que tem que estar lá. Agora quando você ama aquilo, passa por cima de qualquer dificuldade pra surfar um tubão. Tem muita gente da minha geração que tinha tudo para estar aqui, se destacando em Pipe. O Phil (Rajzman) é um exemplo. Quando comecei a vir para o Hawaii com ele, ele era um dos mais sinistros, descia qualquer coisa. É que ele escolheu outro caminho, o do longboard. E porque ele é tão talentoso, virou campeão mundial. Mas acho que ele seria igualmente talentoso se tivesse se dedicado a surfar ondas pesadas. E eu fico muito feliz de ver essa nova geração aí dando esse gás. Nos últimos anos era muito difícil ver outro brasileiro em Pipe durante a temporada inteira. Sempre tinha um ou outro, mas nunca um número significativo durante todos os meses de onda. Hoje em dia eu vou surfar e lá estão o Guigui (Wiggolly Dantas), o Marco (Giorgi), o Jê (Jerônimo Vargas), o Ricardo (dos Santos), o Camarão ─ os moleques estão lá na água amarradões, botando pra baixo, surfando bem, pegando as ondas. E principalmente, esses moleques têm respeito. Eles chegam ao mar e sabem se portar, por isso não arrumam problemas e pegam boas ondas. Tem que chegar cedo e tal, mas não tem essa, dá pra pegar as bombas. Durante o dia, no ápice do crowd, é mais difícil, mas ainda dá pra pegar uma boa. E se eles estão se dedicando agora a Pipe, nessa época de formação deles, terão muito mais facilidade de se dar bem no Circuito Mundial. Se eles surfarem bem aqui, vão chegar a qualquer lugar e arrebentar, vão fazer bonito quando chegarem ao WCT.

11. PARA FINALIZAR, VOCÊ FICA PERMANENTEMENTE? TEM PLANOS A LONGO PRAZO?
Sinceramente não faço planos a longo prazo. Vou vivendo a vida de acordo com o que vai acontecendo. Várias mudanças acontecem no caminho, no decorrer do ano. Agora estou vivendo o momento. Estou vivendo aqui, estou feliz aqui. As coisas estão acontecendo pra mim e enquanto elas estiverem acontecendo, estarei aqui. Mas ninguém sabe o dia de amanhã.