O que o presidente Lula chamou de marolinha vem se mostrando Pipeline 10 pés. Sim, a crise que assola o mundo capitalista chegou ao surf. Boatos de quebras de empresas, atletas de ponta sem patrocínio, eventos importantes com número pequeno de inscritos, tudo isso é reflexo da ruína do mercado financeiro no último trimestre de 2008, fazendo com que as projeções deste ano se tornem nebulosas.
No início de janeiro último, surgiram informações de que a Quiksilver estaria "quebrada". A gigante da surfwear, até então maior empresa do ramo, tinha feito uma série de aquisições que se mostraram equivocadas, estava com dificuldades em renovar impréstimos bancários para poder ter capital de giro e demitiu centenas de funcionários. Oras, se uma potência como essa passava por sérios problemas, o que seria do restante das marcas? Sua situação agora parece estar estável após a venda da DC Shoes e a renovação de contratos com bancos.
Menos mal que a Billabong, outra mega empresa, soube administrar melhor seus negócios e se mantém afastada de boatos catastróficos. Mesmo assim assinala que não pretende esbanjar. A própria decisão de aproveitar a brecha dada pela ASP e já usar em 2009 o novo formato que diminui em um dia as etapas do WCT já demonstra um certo pensamento de que a redução de custos pode ser uma tentativa de facilitar as coisas para não alterar muito o calendário de eventos do Circuito Mundial, já diminuído com a saída da Globe, em Fiji. Lembre-se, a Billabong banca quatro das dez etapas do ASP World Tour (Teahupoo, J-Bay, Mundaka e Pipeline).
O Hang Loose Pro Contest em Fernando de Noronha, foi outro caso típico dos efeitos da crise. Apenas 96 competidores estiveram no arquipélago brasileiro em fevereiro para disputar a etapa 5 estrelas, que em 2008 teve status prime. Destes 96, alguns locais ganharam vagas pela falta de surfistas para completar as 24 baterias da primeira fase e apenas 13 estrangeiros resolveram embarcar para lá, sendo que nenhum deles era atleta de ponta.
A Abril Eventos, que realiza o SuperSurf junto com a Abrasp, também corre atrás do tempo para definir mais um patrocinador fechando a cota necessária para não ter prejuízo na promoção do Circuito Brasileiro. Ninguém pode descartar a hipótese de menos uma etapa das cinco que acontecem, já que é preferível diminuir ao invés de sumir.
Os atletas, sempre o lado mais fraco, sofrem com perdas dos patrocínios. Raoni Monteiro, Léo Neves e Pedro Henrique são alguns dos que estão com os bicos de suas pranchas sem logo. Os três citados, que tem mais apelo de mídia, simplesmente não conseguem arrumar marcas para bancar suas altas despesas devido a necessidade de disputar o WQS. Com o dólar beirando os R$ 2,50, os gastos aumentaram mais de 30% inviabilizando projetos e dando uma desculpa a mais para as marcas na hora de renovar ou dispensar surfistas. Sem contar que parece existir uma idéia fixa entre os empresários de que atualmente vale mais a pena investir nos mais novos, mais baratos e com menos dor de cabeça, educando-os como profissionais e preparando uma geração mais voltada para a linha bom moço "Mineirinho", que mostra ser mais coerente com que se espera de um atleta de alto nível.
Até o calendário do WQS, com seis eventos do Brasil, me parece surreal, visto que com a expectativa do dólar alto e o poder público sendo obrigado a cercear seus custos, pelo menos 1/3 das provas que constam na lista podem ser eliminadas. Pessimismo? Não, apenas constatação. Se o cenário não melhorar, acho que a ASP South America também será uma das vítimas da tsunami devastadora do mercado financeiro.
Torço, junto com todos, para que as coisas se acertem e que o surf não fique prejudicado mais do que parece estar. É bem verdade, que em épocas de crises surgem as grandes idéias na busca para driblar os problemas da falta de grana. O que o surf precisa no momento é de pessoas responsáveis, equilibradas e que não metam os pés pelas mãos. Não adianta querer fazer projetos mirabolantes sem condições para tal. Da mesma forma que não será dispensado um atleta que a empresa irá se capitalizar. Todas as ações devem ser pensadas em conjunto e a aposta de que este mar de ressaca vai acalmar é a melhor maneira de não cometer atos impensados que apenas irão enfraquecer o mercado do surf como um todo.