"Surfar é um modo de vida, é também interação com outras pessoas, com os costumes, com a história. Você pode tocar um mesmo acorde de cem maneiras diferentes, mas isso não é tocar uma peça musical. O desafio é tocar a música toda, que não está só na água" [Peter Troy, na Folha de S. Paulo. 2002].
29 de setembro marcou a última onda do australiano Peter Troy, 59 anos, que não resistiu a um coágulo de sangue no pulmão. Viajante incansável, ele surfou em mais de 130 países, como no Brasil de 1964. Em pleno ano do golpe militar, Troy fez a revolução no surfe brasileiro ao aterrisar no Arpoador, vindo da Amazônia e Peru. Num cenário dominado pelas pesadas madeirites, o aussie chocou os cariocas mostrando o que acontecia ao surfar com uma prancha muito mais leve, de fibra de vidro: manobras, muitas manobras. Troy pegou uma prancha de fibra emprestada do filho do embaixador francês no Rio, que não sabia usá-la. "As pessoas surfavam usando pés-de-pato. Entrei na água sem pé-de-pato e levei a prancha até o lado da pedra. Dessa forma, ganhei velocidade e comecei a manobrá-la e fazer coisas que os garotos do Brasil nunca tinham visto", afirmou à Folha de S. Paulo em 2002.
Ele ainda mandou vir da Austrália os primeiros outlines que serviram de base para a produção das primeiras boas pranchas de fibra no Brasil. Graças a Troy começou assim o surfe brasileiro moderno.
Além da revolução brasileira, Troy foi um lendário descobridor de picos perfeitos, como as direitas de Nias, Indonésia, em 1975; um dos primeiros a surfar a onda mítica australiana, Bells e cruzou o mundo pegando carona, não só para surfar (adorava todo tipo de ambiente natural e conhecer gente). "Antes de morrer ele planejava uma viagem à Antártica", revelou seu amigo, Phill Jarrat.
Além de grande explorador, Peter Troy foi, sobretudo, um mestre em viver. Mais que revelar picos de sonho e elevar a performance e arte no surfe, ele acrescentou algo muito mais elevado ao mundo das ondas.