Yallingup Surfilm Festival


Pela primeira vez a cidade de Yallingup, no oeste da Austrália, vai entrar na rota dos festivais de filme e arte ligados à cultura surf. A edição inaugural do Yalling Surfing Festival ─ YSF acontecerá de 8 a 10 de janeiro de 2010, no Madfish Winery e terá diversas apresentações a céu aberto.

O evento terá shows de música ao vivo, exposição de obras de art-surf e exibição de filmes curta e longa-metragem relacionados ao esporte mais popular da Austrália, além de debates e palestras dos autores sobre o processo de criação de suas obras. Os organizadores do YSF convocam artistas de todas as partes do mundo para participarem do inédito encontro. O período para fazer a inscrição vai de 1º de junho a 1º de outubro deste ano.

O YSF é uma instituição sem fins lucrativos e quer aproveitar o festival para chamar a atenção para a importância do trabalho da SurfAid International e da preservação do oceano e do meio ambiente. A organização do festival entrou em contato para que brasileiros interessados em participar tivessem às informações sobre o evento. Para conhecer as regras e os formulários de inscrição, visite o site clicando aqui.

UM NOVO TOUR?

Depois de fazer a diferença dentro d'água, desde o início da década de 90, quando apareceu com um surf extremamente rápido, moderno e consistente nos campeonatos, liderando inclusive uma ditadura velada de pranchas estreitas e finas de espessura que durou uns 15 anos, Kelly Slater agora quer fazer a diferença também fora d'água.

Ele está por trás de um outro circuito mundial de surf que foi chamado por um jornal australiano de "Reber Surf Tour", veículo que também chama de "grupo rebelde" o trio formado pelo americano nove vezes campeão do mundo, o seu empresário, Terry Hardy, e um ex-promoter de boxe, Matt Tinley.

Esse circuito seria formado por 16 surfistas, sendo oito permanentes (os mais famosos? os mais bem rankeados na ASP? escolhidos pelo Kelly?) e oito convidados (convidados por quem?). De cara fica claro a característica bem elitista da idéia. Se por um lado podemos apostar na escolha de surfistas espetaculares, nem sempre eficientes ou pacientes com as ondas e a maratona do WQS, por outro será difícil aceitar o campeão desse circuito como um Campeão Mundial de Surf Profissional.

Talvez esse nem seja o intuito da turma "rebelde" e esse circuito possa conviver harmonicamente com o da ASP.

O circuito começaria no segundo semestre de 2010 e seria formado por oito etapas realizadas em cinco meses. Aqui estaria atendida uma reinvindicação antiga dos competidores ─ que o surf profissional tivesse um calendário parecido com outros esportes, como futebol americano, que tem pré-temporada e temporada formada por cinco a seis meses por ano, no máximo. Os surfistas profissionais de ponta sempre reclamavam muito da falta de "férias", da falta de um período que pudessem ficar com a família, sem viagens e compromissos competitivos profissionais. O circuito sempre terminou dias antes do Natal e, menos de dois meses depois, no final de fevereiro, já estavam todos reunidos compulsóriamente para a primeira etapa do ano seguinte.

Por último, e mais importante, com um pré-acordo já assinado com a rede esportiva de TV por assinatura ESPN e consequente maior exposição garantida às empresas que aderirem, as oito etapas distribuiriam um total de US$ 12 milhões de premiação, aproximadamente R$ 24 milhões. Isso dá US$ 1,5 milhão de premiação por etapa, dividido entre 16 competidores. Uma média de US$ 93.750 para cada atleta em cada etapa, se a premiação fosse dividida igualmente por todos. No World Tour, organizado pela ASP, cada etapa distribui atualmente US$ 340 mil. Essa premiação, que é 4,4 vezes menor, ainda é dividida por três vezes mais atletas. Cada um dos 48 competidores do WT da ASP ficam com uma média de US$ 7.083 em cada etapa.

A diferença de premiação média para cada competidor, quase 13,5 vezes maior, seria gritante. Surfistas espetaculares ao redor do planeta devem estar sendo bombardeados por uma explosão de luz brilhante invadindo a perspectiva de sua carreira. Uns abandonaram o tour precocemente, pois chegaram à conclusão de que não tinham paciência nem aptidão para ficar trocando de aeroporto dez meses por ano. Alguns nem tentaram. Outros se aposentaram depois de anos, pelo simples cansaço da rotina que não mudava, mas ainda têm surf no pé para fazer frente a qualquer um em ondas fortes e de qualidade.

Querem vários exemplos? Jamie O'Brien, Andy e Bruce Irons, Shane Dorian, Bruno Santos, David Rastovich, Manoa Drollet, Rob Machado... Sem falar em alguns surfistas especiais da nova geração que poderiam fazer um voo sem escala pela ASP, aterrizando direto no circuito rebelde, como Clay Marzo, Pablo Paulino, Owen Wright, Ry Craike, Julian Wilson, Kai Borger...

Ainda com relação aos possíveis candidatos, aí vai mais um palpite "de cocheira" ─ o brasileiro Heitor Alves me contou na semana passada que o Kelly Slater disse a ele, recentemente, que o surf dele era inspirador, que tinha vontade de treiná-lo e de "trabalhar" com ele. Coincidentemente, Heitor foi um dos poucos e ilustres convidados do WPS All Star Expression Session, que aconteceu antes da final do WQS Hurley US Open, no final do mês de julho em Huntington Beach, Califórnia. E Rob Machado, um dos principais conselheiros desse WQS cheio de eventos diferentes, é um dos melhores amigos de Slater. O convite ao Heitor também incluía um quarto exclusivo no hotel em frente ao píer durante o evento (um luxo naquela área caótica e problemática), uma mochila de "boas-vindas" na cama do quarto com um MacBook Pro (a BMW dos lap tops) entre os vários brindes, e um jantar classudo com a nata da elite e os melhores amigos do "homem" ─ Shane Dorian, o videomaker Taylor Steele, o músico Jack Johnson... claro, o transporte entre o hotel e o restaurante foi feito em duas limusines enormes.

Bom, até aqui as notícias no campo das especulações.

A seguir, neste fim de texto, minhas opiniões.

A principal queixa do Kelly Slater seria a incapacidade da ASP para promover o surf e os surfistas a um outro patamar capaz de atrair o público de massa e patrocinadores corporativos.

Primeiro, não sei se gostaria de ver o surf tão popular quanto o futebol brasileiro ou o basquete americano. Acho que o surf em seus vários aspectos teria mais a perder do que ganhar.

Segundo, mesmo concordando que 16 surfistas espetaculares junto com a garantia de excelente exposição por uma rede de TV esportiva mais uma premiação alta devem gerar um interesse maior do que o circuito que está aí, não sei se será suficiente para atrair grandes corporações que fiquem envolvidas depois que a novidade se tornar um padrão.

Terceiro, a única "novidade" no formato de julgamento que eu soube é que o aéreo (e suas variações) será um tipo de manobra obrigatória para os competidores receberem uma nota 10 perfeita. Ótimo para nós surfistas, mas só isso não será suficiente para atrair o grande público. O julgamento continuará subjetivo e o grande público continuará sem entender a diferença entre um 7,35 e um 8,80. Vai continuar sem entender também toda essa história de "cortar o menor e o maior juiz", a "soma das duas melhores ondas", ou seria "a soma das duas melhores notas"? Ou é a mesma coisa?

Ouvi falar também que teria uma pontuação específica para cada manobra específica, mas mesmo assim um aéreo será um pouco mais alto ou um pouco mais invertido ou um pouco mais difícil de aterrizar... E por aí vai.

Os principais esportes de massa são preto no branco. No futebol é bola na rede. No tênis e no vôlei é bola na quadra dentro das quatro linhas. No automobilismo é quem cruzar a linha primeiro. No basquete é bola na cesta. Até no futebol americano, no rugby e no beisebol, que são um pouco mais complexos, tem linha para cruzar, base para ganhar com os pés ou rebater com um taco aquela bolinha dura no meio da arquibancada.

Bom, vamos ver aonde essa possibilidade vai nos levar.

Mexer nas estruturas é sempre bom.

Que o surf evolua sem perder o estilo.

07 perguntas para... Willian Woo

O PAULISTANO WILLIAN WOO VENDEU BISCOITOS PARA COMPRAR A PRIMEIRA PRANCHA, JÁ FOI PROPRIETÁRIO DA ATLÂNTICO SURFBOARDS, DEU AULAS DE MATEMÁTICA E ATUOU COMO INVESTIGADOR DA POLÍCIA CIVIL. AOS 41 ANOS DE IDADE E SURFISTA HÁ 25, ELE EXERCE O SEGUNDO ANO DE SEU MANDATO COMO DEPUTADO FEDERAL E AFIRMA QUE DESEJA INCENTIVAR E FOMENTAR O SURF CADA VEZ MAIS.


01. Como começou sua ligação com o surf?
Foi em 1984, quando meu pai adquiriu um pequeno negócio em Bertioga, no litoral paulista. Passei a freqüentar mais a praia e resolvi começar a surfar, mas meu pai nunca foi um apoiador do esporte. Então passei a vender biscoitos na balsa que fazia a travessia Bertioga-Guarujá, para conseguir comprar a minha primeira prancha, uma monoquilha feita pelo Thyola. Desde então, foram anos de muita dedicação e, em 1986, eu já tinha uma fábrica de pranchas de surf, chamada Atlântico. Fizemos várias pranchas lá em Bertioga. Até hoje, amigos que começaram comigo ainda continuam no ramo.

02. Como deputado federal, o que você já fez pelo surf?
Ainda muito pouco, pois estou no meu primeiro mandato que começou há dois anos. Mas tenho ajudado principalmente o surf universitário, nos Circuitos Paulista e Brasileiro. É uma oportunidade de os atletas pontuarem e conseguirem bolsas de estudo nas universidades. Eu tenho ajudado também o Circuito Paulista Pro e este ano espero colaborar em algumas etapas do WQS. Também ajudo em ações de preservação do meio ambiente, que estão diretamente ligadas ao interesse dos surfistas, e nas ações que buscam regulamentar o tow-in no litoral brasileiro. Entre as discussões sobre o surf que temos proposto, há projetos de lei para criar previdência para atletas. Procuro colaborar também com a estrutura do Hang Loose Pro Contest, em Fernando de Noronha, um dos campeonatos que mais trazem visibilidade em nível internacional.

03. E como seria essa aposentadoria do surfista profissional?
Através de debates, algumas pessoas me mandaram via e-mail essa sugestão. Na verdade, qualquer pessoa pode fazer isso como autônomo. Mas foi uma forma de conscientizar os atletas de que um dia terão que pensar na aposentadoria. Muitos partem para outras posições no ramo quando param de competir. Mas é preciso pensar que, no longo prazo, todos em qualquer atividade precisam de alguma forma de previdência pública ou privada. Hoje já existe uma modalidade que a pessoa pode recolher, de acordo com sua vontade, um valor especifico por mês.

04. Na questão ambiental, como um deputado pode ajudar?
Principalmente através de entidades que nos procuram para buscar parcerias com o poder público. Por exemplo, junto com a Sabesp, conseguimos apoio para a escola Suprema, de São Vicente, que além do trabalho ecológico, faz um trabalho de escola de surf e de integração com jovens internos da Febem. Temos ações com ONGs, que pedem apoio de sacolinhas de lixo e parcerias com a Cetesb. Esses programas são importantes porque difundem a importância de conscientizar as pessoas de recolher seu lixo da praia, principalmente resíduos plásticos, que levam mais de 500 anos para se decompor.

05. Qual a importância do eleitor jovem?
Todo eleitor é importante. O principal é o cidadão ter consciência das atividades do parlamento, um dos poderes mais importantes para a democracia. Por mais que a imagem do parlamento esteja negativa, é lá que o povo é representado. Todos os políticos que estão lá não chegaram por uma indicação política, foram votados pelo povo. Mas a qualidade do voto tem que melhorar. Um político do parlamento é eleito para fazer projetos de lei, não para freqüentar eventos e inaugurar estradas e postos de saúde. Isso é importante, faz parte do nosso dia-a-dia, mas o mais importante é fiscalizar como é gasto o dinheiro publico e fazer leis que favoreçam toda a sociedade.

06. Como você concilia seu trabalho com o surf?
Quando era vereador eu tinha tempo para surfar. Estou na política há oito anos, fui vereador por um mandato e meio, e estou a dois anos como deputado. Agora está muito difícil. Fiz uma prancha nova e levei mais de três meses para eu buscar. Antigamente, apressava o shaper para saber quando estaria pronta. Este ano tirei quinze dias de férias e não deu ondas boas no período. Durante o atual mandato fui duas vezes para Fernando de Noronha, peguei ondas pequenas. E infelizmente Brasília não tem mar. Nos finais de semana eu visito cidades no Brasil, já fui algumas vezes para a Amazônia, fui para a Antártica, Haiti, e agora estou indo para o Japão ver a questão dos brasileiros que estão sem emprego. Procuro assistir programas de surf na TV, comprar as revistas todo mês, e principalmente conviver com amigos que vivem o surf. Tento buscar um pouco dessa energia dos surfistas e levar para o meu trabalho político.

07. O que você acha da absurda cobrança das empresas aéreas sobre pranchas de surf?
Penso em criar uma legislação especifica para as pranchas. Eu acho injusto os valores cobrados. Mas ao consultar a ANAC, vi que é muito difícil legislar sobre isso. As empresas são internacionais e a legislação seria só para o Brasil. As companhias aéreas não vivem para carga, e a prancha ocupa um espaço grande na logística das bagagens. Eu já tive vários atritos com isso, inclusive quando saiu uma matéria na Fluir sobre o assunto, eu estava em Fernando de Noronha e não paguei as taxas me baseando na matéria. Há uma legislação especifica para a cobrança de qualquer mercadoria e as companhias aéreas têm liberdade de cobrar qualquer valor. A verdade é que a cobrança é pelo tipo de produto que você está levando, pelo formato e comprimento. Outra coisa que li na legislação, é que quando você quer transportar um objeto em segurança, tem de contratar um transporte de carga. A única coisa que as empresas se responsabilizam é com a mala. Penso em fazer uma pesquisa para saber quantas pranchas precisam para valer a pena mandar pelo transporte de carga. Isso pode servir para os atletas que correm os campeonatos mundo afora e para grupos de freesurfers que viajam juntos.

Perfil: Sergio Laus

O cabelo loiro estilo "tigela", os olhos claros e a cara de garoto de Serginho Laus, 29 anos, coincidentemente lembram o ator André de Biase (à época com 24 anos) no clássico do cinema brasileiro "Menino do Rio", produzido em 1981 pelo diretor Antonio Calmon ─ sobre um romance vivido entre um jovem surfista e uma garota da alta sociedade carioca. No entanto, a história desse paranaense, de fala mansa e jeito tranqüilo, nada tem a ver com o filme.

Na última década, Laus construiu uma trajetória cheia de desafios, surpresas, aventuras e até riscos de morte, marcada principalmente por conquistas inéditas e significativas num universo até então inexplorado, que lhe conferiram o status de maior especialista mundial em ondas de rio ─ ou "Tibal Bores", como o fenômeno também é conhecido ─ pela comunidade internacional de "bore riders" (surfistas de Pororoca). Há oito anos, Serginho dedica tempo, dinheiro e muita disposição para entender o funcionamento deste espetáculo da natureza tão encantador quanto destruidor, que ocorre nos Estados do Amapá, Pará e Maranhão, no Brasil, e em vários outros países. Em 2006, Laus publicou pela Ediouro o livro "Pororoca ─ Surfando na Selva", um relato sobre tudo o que viveu até então explorando a mítica onda de rio da Amazônia.

Casado há sete anos com Ana Carolina Pássaro e pai da pequena Marié (que em língua indígena significa "rio do fruto", nome de um dos afluentes do Amazonas), de quase 3 anos, Sergio Laus nasceu em Curitiba, no Paraná, em 26 de novembro de 1979. Filho de Thelma Regina Penetta Laus, de São Paulo, e Sérgio Simões Laus, de Florianópolis, seu início no surf foi incentivado pelo pai. "Passávamos os verões em Balneário Camburiú e foi lá que eu e meu irmão Alexandre, hoje com 26 anos, começamos a pegar ondas. Quando completei 10 anos, ganhei uma prancha de surf Shine, que tenho até hoje", diz Laus.

Aos 17 anos, Serginho começou a competir nos campeonatos amadores do Paraná. "Pouco tempo depois, percebi que o esporte estava meio estagnado e queria fazer alguma coisa para mudar o cenário", conta. O primeiro passo foi criar a Associação de Surf de Monções, praia que ele freqüentava com os amigos do Paraná. Serginho então buscou patrocínios e fez o primeiro campeonato da ASM. O sucesso do evento e os contatos com o mercado o levaram a colaborar com a revista "Hardcore", como correspondente do Paraná. "Cheguei a morar em São Paulo por um ano para trabalhar na redação da revista". Matriculou-se no curso de jornalismo da Faculdade Tuiuti, no Paraná, e entrou de cabeça na profissão. "Faltou cerca de um ano para eu me formar, mas foi no cotidiano de trabalho que acumulei experiência, aprendendo com nomes como Reinaldo Andraus, Edinho Leite, Alceu Toledo Junior e João Carvalho". Serginho foi sócio-fundador da "Boards", primeira revista de bolso do Paraná, e assessor de imprensa da Federação Paranaense de Surf e da Confederação Brasileira de Surf, entre outras empresas e instituições. Há seis anos ele realiza o boletim das ondas do Estado para a rádio Jovem Pan.


A CAMINHO DA POROROCA
No ano 2000, durante uma viagem para o Farol de Santa Marta, Laus foi convidado para uma surf trip que mudaria para sempre sua vida. "Eu estava com o fotógrafo Fábio Paradise na praia da Cigana e encontramos uma galera do Ceará, entre eles o Duda Carneiro e o Marcelo Tibita. Eles nos chamaram para cobrir uma barca que fariam para surfar as ondas da pororoca. Pouco tempo depois, eu estava dentro de um avião com destino ao Amapá, onde encontraria o grupo". Durante o vôo, Laus começou a ligar os fatos. Lembrou de outra viagem, que fizeram três anos antes, na companhia do fotógrafo James Thisted e dos surfistas profissionais Guga Arruda, Teco Padaratz e Saulo Lira, quando pela primeira vez ouviu falar sobra a pororoca. "No ano de 1997, junto com Eraldo Gueiros, o Guga tinha desbravado a pororoca e estava nos contando sobre as aventuras de surfar uma onda de rio cheia de trocos, plantas, piranhas, jacarés e outros animais, num cenário completamente diferente da praia. Na hora até brinquei, disse que eles eram malucos e que eu jamais faria algo parecido", recorda.

Na chegada a Macapá, ele foi bombardeado com avisos e perguntas: "Diziam pra ter cuidado com as piranhas, com as raias, se tinha tomado a vacina contra febre amarela. A primeira investida foi para a Ilha da Caviana, mas o surf não rendeu. Voltamos a Macapá e procuramos o Detur ─ Departamento de Turismo, para nos ajudar a chegar até o rio Araguari, onde havia uma pororoca maior e mais potente". O governo deu o suporte necessário a eles seguirem viagem. "No primeiro dia deu tudo certo, surfamos a onda por mais de quinze minutos e estávamos em êxtase". No dia seguinte, no entanto, eles tiveram o primeiro encontro com o real poder de destruição da pororoca. "Estávamos começando a surfar a onda quando eu e o Bibita olhamos para o lado e vimos uma lancha virando, a outra quase, os pertences na água, o Paradise afundou com a câmera, enfim, um cenário caótico no meio da selva. A situação era extrema e graças à perícia de Marcio Pinheiro, piloto que está na minha equipe até hoje, conseguimos salvar uma das lanchas e retornamos para nossa base, mas perdemos a outra. As lanchas eram do Batalhão Ambiental e tivemos que fazer Boletim de Ocorrência e prestar depoimentos sobre o incidente, foi aberto inquérito, um transtorno. Voltamos escoltados para Macapá. No fim, entenderam a situação e nos liberaram", relata Serginho sobre a primeira aventura que viveu na selva.

Na época, o paranaense Noélio Sobrinho, fundador e presidente da Abraspo ─ Associação Brasileira de Surf na Pororoca, passou a convidar Laus para participar e ajudar na divulgação dos eventos ligados ao fenômeno. Natural de Belém, Sobrinho foi um dos pioneiros do surf na pororoca, graças à proximidade e facilidade de acesso à onda de São Domingos do Capim, uma das primeiras a serem surfadas na região. “Por conta desses convites, meu envolvimento com a Pororoca foi crescendo. Eu sempre gostei de estar em contato com a natureza, adorava aventura e tinha conhecido uma onda perfeita em plena selva amazônica. Mas fazia isso por instinto. Cerca de três anos depois do primeiro contato, quando percebi o potencial turístico do fenômeno, me dei conta que aquilo poderia ser meu projeto de vida e comecei a ver a pororoca com um olhar mais empreendedor", revela. O faro jornalístico de Laus aliado à rápida e abrangente exposição proporcionada pela internet fez com que suas ações ganhassem o mundo. Sempre que alguém digitava a palavra pororoca no Google, o nome de Sergio Laus aparecia vinculado de alguma forma. "Comecei a organizar grupos para expedições, criei pacotes, fiz parcerias e a coisa deslanchou". No início as expedições eram compostas na maioria por equipes de grandes grupos de mídia internacional, como CNN, BBC de Londres, Discovery Channel, Reuters, a TV5 da França, NHK do Japão, entre outras.

No ano passado, Laus foi procurado por Jean Cousteau, filho do oceanógrafo e pesquisador francês Jacques Cousteau (morto em 1997, aos 87 anos), um dos primeiros estrangeiros a explorar a região amazônica, para dar as coordenadas a uma visita à pororoca. O paranaense também foi chamado para ser consultor e participar da nova campanha publicitária da montadora japonesa Nissan para o modelo X-Limit, cujo tema central foi a pororoca do rio Araguari. A superprodução envolveu mais de 60 pessoas, uma tonelada e meia de equipamentos, três carros vindos do Japão, três grupos de trabalho (brasileiros, japoneses e americanos) e três surfistas: o norte-americano Jon Rose, o japonês Masatoshi Ohno e Sergio Laus, a um custo aproximado de 2 milhões de reais.


O SURF NO RIO
Serginho é categórico ao dizer que o surf na pororoca é praticamente outro esporte. "Na pororoca, a gente nunca sabe o que vai encontrar e a adrenalina é sempre grande. Os bancos de lama mudam de lugar a todo o momento e o cenário parece de guerra, pois ela arrasa tudo por onde passa. Surfar a pororoca é um ritual que deve ser planejado meticulosamente", explica. Graças a exploração do surf na pororoca, as populações ribeirinhas encontraram uma nova forma de subsistência e se desenvolveram mais rapidamente. Segundo Laus, cada expedição conta com uma equipe que pode variar de 10 a 25 pessoas, entre cozinheiros, pilotos, práticos, ajudantes, além dos beneficiados indiretamente no comércio local. "Por outro lado, cada expedição com todas as propriedades abertas, ou seja, condições plenas de explorar ao máximo o fenômeno, custa pelo menos 30 mil reais para uma equipe pequena", completa Laus. Com mais de trinta temporadas na selva, ele possui parceria com a PMAP (Polícia Militar do Amapá) para troca de informações sobre a rota da pororoca, com treinamentos de navegação diante do fenômeno e apoio do Batalhão Ambiental, sempre presente nas expedições.


O RECORDE
Sergio Laus é o atual detentor do recorde de permanência em onda de rio pelo "Guiness Book". Em 2005, ele organizou uma expedição especialmente para esse fim, concluída com sucesso com a marca de 10,1 km percorridos. Entretanto, o recorde foi algo que surgiu por acaso na vida deste apaixonado pelo surf na selva. "Nunca tive pretensões de bater algum tipo de recorde. Sempre buscamos superar nossos limites e ver quem conseguia permanecer por mais tempo na onda, entre amigos. Quando surfamos 16 minutos, em 2000 no Araguari, achamos que era o máximo. Depois atingimos marcas superiores a 30 minutos. Em 2004, recebi a proposta de tentar bater o recorde do inglês David Lawson, que a nove anos detinha o recorde de 9,1 km percorridos na onda do rio Severn, no Reino Unido. Aceitei o desafio e montei toda a estrutura para atender as exigências do 'Guiness'. No dia 24 de junho de 2005, a bordo de um longboard, tive a honra de trazer para o Brasil o recorde mundial de permanência numa onda de maré". Com a quebra do recorde, veio a idéia de escrever um livro sobre as aventuras na pororoca. "Como eu sempre relatei em um gravador minhas experiências, foi fácil reunir os detalhes de nossas peripécias", completa Laus.

O livro "Pororoca ─ Surfando na Selva" traz toda a trajetória de Sergio Laus até o ano de 2006, data da publicação. Entre as inúmeras aventuras relatadas, está a expedição "Surfando na Selva ─ Mascaret", também em 2004, em que Laus e sua equipe desbravaram as ondas de rio da França, onde o fenômeno é conhecido como Mascaret. "O surf na Mascaret é mais tranqüilo, a onda é menor e mais fraca que no Brasil. Mesmo assim passamos um momento de sufoco e quase protagonizamos o primeiro naufrágio no pico", conta Laus. A expedição virou um documentário, chamado "Expedição Mascaret ─ Surfando na Selva", produção de Laus com o cinegrafista Vinicius Sguarezi sobre a primeira equipe brasileira na onda. Além deste, já foram produzidos mais quatro filmes sobre a pororoca com a participação de Serginho: "Long Wave", produção inglesa que marca os 50 anos de surf de maré na Inglaterra; "Le Fils de La Lune", produção francesa com parceria da Thallassa e TV5 que mostra as ondas de maré da França (Mascaret), China (Black Dragon) e Brasil (Pororoca); "Pororoca", produção canadense com os melhores kayaers do mundo; "Poroc Poroc Surfando na Selva", produção brasileira de Laus e Vinicius Sguarezi sobre a pororoca e a Mascaret, que encarta o livro "Pororoca ─ Surfando na selva"; e "Pororoca ─ The longest Wave Ever" (EUA - Japão), produção da agência TBWA do Japão em conjunto com a produtora americana Transition Productions para o comercial e filme documentário da Nissan.


PÂNICO NA SELVA
Ao mesmo tempo em que encanta, a pororoca pode ser extremamente assustadora e perigosa. Serginho já sentiu na pele o poder do fenômeno em situações extremas. Na segunda incursão ao rio Araguari, em 2003, ele e o ex-surfista profissional carioca Ricardo Tatuí decidiram sair remando até uma seção da onda que Laus surfara por mais de 15 minutos no dia anterior. Foram 30 minutos até a bancada de lama, de onde caminharam por mais meia hora até o espumeiro, que segundo Laus mais parecia um tsunami: “a onda tinha uns 3 metros de altura fechando de margem a margem a margem do rio. A visão era assustadora. Mesmo assim o Tatuí remou para o fundo, e na ânsia de surfar aquela onda fui atrás dele. Mas a muralha de água era mais rápida e fomos literalmente atropelados”. O carioca escapou do caldo, mas Laus ficou no núcleo da espuma, sacudindo como um palito de fósforo em uma máquina de lavar. “Foi quase 1 minuto de pânico. Segurei a prancha com todas as minhas forças, mas o fôlego acabou e comecei a engolir água. Até que finalmente consegui sair da avalanche”. Apesar de sobreviver ao tranco, Laus saiu com uma forte dor na região lombar. Depois de passar por um médico, foi constatada uma fratura na apófise lateral direita da L5, coluna lombar. Sua recuperação demorou cinco meses.

Na época, chegou a pensar em abandonar o surf na pororoca. Mas seu destino já estava traçado e o reencontro com o rio aconteceu um ano depois, novamente no Araguari, numa etapa do Circuito Brasileiro. Com o trauma superado, ele avançou na competição e chegou até a final, perdendo para o cearense Adilton Mariano. Antes disso, um episódio quase manchou para sempre a reputação da Pororoca na mídia internacional. Duas equipes estrangeiras que cobriam o evento, da CNN e de uma emissora alemã, estavam de partida. Por volta das 14 horas, eles sairiam de barco até uma fazenda próxima da base do evento, onde pegariam um pequeno avião até Macapá e de lá voariam para os EUA. No meio do caminho, o motor da voadeira que os levava parou, deixando-os à deriva no meio do rio, a poucas horas da chegada da onda. A correnteza levou o barco direto para a foz do Araguari, ponto mais perigoso da pororoca. Enquanto isso, o avião que os levaria até Macapá sobrevoou a área para ver se algo errado havia acontecido. Por sorte, o piloto avistou a voadeira encalhada num imenso banco de lama, prestes a ser engolida nos últimos momentos de luz do dia. Numa tentativa desesperada, escreveu dois bilhetes informando a situação, colocou cada um numa garrafa e passou a dar rasantes na fazenda que servia de base para a expedição, a fim de chamar a atenção dos bombeiros. As duas garrafas foram jogadas sobre a área e uma delas foi encontrada pelo sargento da corporação, que imediatamente organizou o resgate. Perto da meia-noite, quando todos já esperavam o pior, eles retornaram com os jornalistas cobertos de lama e em estado de choque, mas vivos. “Olhei para o repórter da CNN, Harris Withback, e ele fez um sinal de positivo. Vi no olhar dele que a experiência, apesar de aterrorizante, tinha sido uma grande aventura, uma espécie de batizado na floresta amazônica”, recorda Laus.

A situação mais sinistra vivida pelo “rei da pororoca” aconteceu em 2001 na ilha de Marajó, Pará. Na companhia do surfista catarinense Andreas Eduardo e do fotógrafo Motaury Porto, Laus ia competir num campeonato organizado por Noélio Sobrinho na maior ilha fluvial do país. Era a quarta viagem dele à Amazônia. A onda era tão temida que o prático contratado para levar o barco até o local desistiu a poucas horas do destino final, depois de navegar por mais de 30 horas contornando a ilha. “Diziam que a pororoca iria nos matar. Mas o Noélio arrumou um sujeito, bem esquisito, disposto a encarar a missão. Apesar da má impressão, seguimos viagem”. Porém, uma sucessão de imprevistos começou a ditar os rumos. “Na primeira noite, o barco estava amarrado a uma árvore e quase entornou depois que a maré subiu demais em pouco tempo. Na seqüência, um dos jet-skis a bordo pegou fogo próximo aos tanques de combustível, quase causando uma explosão fatal. No dia seguinte, o novo prático também desistiu e tivemos que navegar por duas horas até o ponto em que surfaríamos. Saíamos então em duas lanchas, no meio do nada e sem nenhum equipamento de segurança, rádio, GPS ou sinalizador. Chovia e o cenário era tenebroso. Quando achamos que a pororoca estava chegando, percebemos que era uma miragem. Na verdade, era um enorme banco de lama, e encalhamos poucos minutos antes de a onda verdadeira despontar no horizonte”. O pânico tomou conta de todos, e a pororoca chegou atropelando. Uma das lanchas foi atingida e deixou um grupo isolado na margem do rio, aguardando a outra lancha voltar. Ficaram algumas horas na casa de um caboclo e decidiram sair em busca do barco principal. Depois de algumas tentativas em vão, tiveram que retornar à casa do ribeirinho. “Ficamos os sete amontoados na pequena sala, que tinha uma televisão, um calendário e três redes. Nosso anfitrião preparou um banquete com carne de capivara, feijão e farinha. Nada mal para quem estava faminto, perdido na selva a 40 horas do ponto de partida. Durante a noite, ouvimos o estrondo da pororoca passando, parecia que ia derrubar a casa. No dia seguinte, saímos em mais uma tentativa de encontrar o barco principal, mas acabamos em outra fazenda, onde passamos o resto do dia e mais uma noite frio e sem muita comida, com a gasolina quase no fim. Por várias vezes, pensei em sair pela selva em busca de ajuda”. No terceiro dia, finalmente um barco apareceu para resgatá-los. “A alegria foi geral e o reencontro com o restante da tripulação foi emocionante”, conta. Antes de voltar para a terra firme, o grupo ainda teve o gostinho de surfar a pororoca, pequena e curta, na inóspita região conhecida como “Ninho das Pororocas”.


O DRAGÃO NEGRO
Entre as ondas de rio que ocorrem mundo afora, uma é conhecida como “a onda proibida”. Ou pelo menos era, até Serginho decidir surfá-la. A Black Dragon acontece no rio Quintang, província de Hangzhou, nordeste da China, próximo a cidade de Shangai. O fenômeno de maré é cultuado por milhares de pessoas, que se aglomeram às margens do rio para observar sua passagem. Antes da equipe Surfando na Selva, apenas duas equipes tentaram pegar a onda proibida: ingleses pagaram uma fortuna para o governo chinês, mas naufragaram; e franceses entraram ilegalmente e foram detidos. Era o cenário perfeito para o paranaense, que mais uma vez teria a chance de ser o pioneiro. “Por sorte, conheci um surfista brasileiro chamado Daniel que mora na China há anos. Ele topou ajudar e começou a mexer os pauzinhos. Em São Paulo conheci o deputado Willian Woo, que possui descendência chinesa e também é surfista. Ele conseguiu marcar uma audiência em Brasília com o embaixador da China. Depois de mostrar o projeto e provar que tínhamos capacidade de encarar a onda, começamos a negociar. A primeira barreira foi o custo, que beirava meio milhão de reais na época”, comenta Laus.

As negociações continuaram e os chineses quiseram fazer um intercâmbio para conhecer o Brasil, Serginho recebeu o chefe de esportes aquáticos da China, Wei Xing. O combinado era que depois eles receberiam o grupo brasileiro. “Eu, que sempre odiei política, tive que fazer um trabalho diplomático para conseguir as autorizações”. O resultado foi que eles não só conseguiram as permissões, como tiveram todos os custos bancados pelos chineses, sendo a primeira equipe com autorização oficial e totalmente patrocinada pelo governo para iniciar o surf na Black Dragon. A expedição aconteceu em julho do ano passado. Além da recepção em grande estilo, participaram de jantares com o alto escalão chinês, de reuniões com diversos departamentos do governo e foram destaques na imprensa local. Tudo isso a um mês do início das Olimpíadas. “Sempre nos levavam aos restaurantes mais chiques e serviam pratos bizarros. Para dar uma idéia, um dos melhores foi um filé mignon de Yorkshire ao molho madeira. Isso mesmo, carne de cachorro. E o pior, minha mãe tem um dessa raça. Quando contei ela ficou apavorada. Dizem que na China eles comem tudo o que possui quatro pernas, exceto cadeiras e mesas. Também comemos língua de pato, bambu, fungo de madeira, bolinho de carrapato, ovo podre, entre outras coisas que prefiro nem lembrar”, diverte-se Laus.

Para atacar o Dragão Negro, ele reuniu uma equipe formada pelos pilotos Márcio Pinheiro, do Amapá, e Glauco Vaz, do Maranhão, o big rider paulista Jorge Pacelli, com uma vasta experiência em pilotagem de jet-ski e resgate em ondas extremas, e o amigo e fotógrafo Likoska. “Na pororoca chinesa, toda a margem do rio é concretada para conter a erosão das fortes marés. Com isso o rio possui um formato perigoso, cheio de pedras, Lages e até ferros contorcidos no fundo”, explica. Após uma investida frustrada, eles finalmente conseguiram surfar ondas de até 2 metros de face no rio Quintang. “Foi uma experiência incrível e a concretização de um sonho. Conquistar a confiança do governo chinês não é fácil e temos orgulho de ter deixado nossos nomes marcados para sempre na história daquele país”, completa o paranaense, que este ano pretende realizar outra expedição para surfar o Dragão chinês, Serginho ainda tem planos de explorar as ondas de rios em países como Alaska, Malásia, Índia, Austrália, EUA, Canadá, Suíça, Alemanha entre outros.

As aventuras de Laus na pororoca ganharam as telas do cinema. Ele é um dos surfistas que participam da segunda edição do longa-metragem “Surf Adventures”, de Roberto Moura, e levará o espectador a conhecer o mundo incrivelmente inusitado e peculiar da Pororoca em plena selva amazônica.

Recentemente, Laus recebeu o título de cidadão macapaense por unanimidade na câmara dos vereadores local. A convite do governo do Amapá, ele irá passar parte do ano no Estado, promovendo o surf na pororoca com o objetivo de fomentar o turismo local aliado à expansão do trabalho que realiza como presidente do Instituto Pororoca e na ONG Maré Amazônia, da qual é idealizador e padrinho ─ e que tem como missão promover palestras, ensaios e encontros para ensinar e difundir a consciência ambiental e a divulgação da cultura nativa brasileira, pilares do projeto Surfando na Selva. “Construir uma carreira fora do eixo Rio, São Paulo, Floripa foi uma prova de persistência e força de vontade. Sempre lutei por meus objetivos e dedico tudo o que conquistei à minha esposa, Ana Carolina, minha filha Marie e minha família, amigos e patrocinadores. Tudo o que apareceu na minha vida, especialmente esse contato íntimo com a selva, fez nascer em mim a responsabilidade de proteger a natureza, de preservar a Amazônia através do surf na selva e difundir a consciência ecológica para as próximas gerações. Sei que logo minha filha irá abraçar esta causa também, que é de todos nós”, conclui Serginho. Apesar de carregar nas costas a responsabilidade de um homem, sempre comprometidos com seus valores e ideais, a cara de menino do rio será sempre sua marca registrada.

Rivalidade amigável

FILME MAIS AGUARDADO DOS ÚLTIMOS TEMPOS, “A FLY IN THE CHAMPAGNE”, REÚNE KELLY SLATER E ANDY IRONS NUM DOCUMENTÁRIO SOBRE A SUPOSTA RIVALIDADE ENTRE ESTAS DUAS LENDAS VIVAS DO SURF MUNDIAL. DURANTE DUAS SEMANAS ELES DIVIDIRAM ONDAS DE SONHO NAS ILHAS MENTAWAI E FALARAM A REAL SOBRE A RELAÇÃO QUE POSSUEM.

Para retratar o encontro de dois astros do esporte, nada mais lógico que uma superprodução digna de Hollywood, com orçamentos estratosféricos, equipamentos de ponta e um cenário cinematográfico. Com essa proposta, a Irons Brothers Productions, dos irmãos Andy e Bruce Irons, iniciou suas atividades em grande estilo. O local escolhido foi o Kandui Resort, nas ilhas Mentawai, onde Kelly e Andy passaram 15 dias surfando algumas das ondas mais perfeitas do planeta e falaram sobre a relação de amizade e respeito que possuem um pelo outro, transformada em rivalidade ferrenha pela mídia ao longo dos últimos dez anos.

Inicialmente pensado para ser um documentário para o canal de TV ESPN, o projeto tornou-se o filme mais aguardado do ano, dirigido por Matt Beauchesne e editado por George Manzanilla, com produção executiva de Andy e Bruce Irons, Chris Cote, Blair Marlin e o próprio Beauchesne.

Além de imagens alucinantes de dois dos maiores nomes da história do esporte, o nove vezes campeão do mundo Kelly e o três vezes Andy, "A Fly in the Champagne" explora o que eles pensam sobre o mito criado em torno desta rivalidade. Diz Kelly: "A imprensa tornou essa história meio desproporcional em vários aspectos. Muita coisa aconteceu nos bastidores e as pessoas não fazem idéia. O ser humano reage quando é pressionado e isso tudo nos consumiu, as pessoas falavam por nós. Sei que o Andy me tornou um competidor melhor, mais focado e forte". Irons confessa que se deixou levar pelas notícias: "Comecei a acreditar no que estava lendo. Entrei no jogo criado pela mídia".

"A Fly in the Champagne" ainda não tem previsão para estrear no Brasil, mas já pode ser encontrado em DVD nos EUA, Europa e Austrália.

Diamante bruto

JADSON ANDRÉ NÃO EXPLODIU TÃO CEDO COMO SEU "VETERANO" COMPANHEIRO DE EQUIPE ADRIANO DE SOUZA, MAS AOS 19 ANOS, VEM MOSTRANDO PERFORMANCES IMPRESSIONANTES DAS QUAIS NÃO ME LEMBRO TER VISTO EM SURFISTA BRASILEIRO EXIBIR.


O surf deste jovem potiguar até lembra um pouco o do seu conterrâneo Danilo Costa, com bastante velocidade e um approach cheio de energia sem focar muito no estilo, mas as manobras aéreas e a força com que Jadson executa seus movimentos em cima de uma prancha realmente me fizeram parar pra pensar e escrever.

Já vi inúmeros talentos no Brasil começarem a se destacar e sumirem no limbo das drogras, escolhas equivocadas, cabeça "pequena", enfim, não é raro garotos com um belo futuro no surf se perderem no meio do caminho. Mas olhando os resultados do protagonista deste texto e as pessoas que o cercam, acho que ano que vem teremos um nome que arrancará expressões incrédulas ─ de forma positiva ─ dos juízes da ASP World Tour.

Há alguns dias assisti pela internet à derrota de Jadson para o ianque Patrick Gudauskas na semifinal do Sri Lankan Airlines Pro, nas perfeitas esquerdas de Pasta Point, nas Maldivas. Mesmo derrotado, o brasileiro simplesmente estraçalhou as ondas durante todos os dias em que esteve na água. Suas rasgadas 270° e os aéreos invertidos são um primor de radicalidade. Com pouco mais de cinco eventos disputados, ele está virtualmente classificado para a elite do surf em 2010. Apenas uma catástrofe fará com que ele não garanta sua vaga já em outubro.

O que levou a ficar de olho no moleque foi sua vitória no Quiksilver Pro Durban, em ondas pesadas na África do Sul. Seu ataque ao lip beirava a irresponsabilidade. Jadson não tem medo de arriscar e isso faz a diferença no seu surf. Diria até que a maturidade faz com que o competidor passe a valorizar manobras eficientes ─ isso não quer dizer manobras fracas ─ que se combinam com as sessões e permitem um aproveitamento melhor da onda. Pois este menino parece programado para aniquilar, sem pensar muito. Talvez por isso seu estilo ainda seja seu ponto fraco, porém nada que mais algumas trips em ondas de qualidade e muitas horas vendo caras bons surfando não possam ajudar.

Achava que Jadson era um surfista que se destacaria em ondas pequenas e médias, até pela sua velocidade e agilidade, mas depois de ver a viagem que ele fez para Carolina Islands, me convenci do contrário. Li que o moleque deu umas batidas de backside insanas em ondas pra lá de cracudas e não amarelou para nenhum lip, mesmo sabendo do coral afiado que estava poucos metros abaixo. As fotos das viradas cheias de pressão confirmaram a pegada do "minino" e atestam que o cabra tem um coice e tanto.

Outros nomes como Alejo Muniz, belo surfista com uma linha de surf impecável, e Wigolly Dantas, moleque atirado, são a prova de que chegamos a um degrau acima do que estávamos, pois além do talento, eles têm uma imagem bacana e se mostram focados em realizar seus sonhos, sem pressa.

Jadson André será o líder dessa turma, não tenho dúvidas. Orientado de forma correta, com um apoio financeiro excelente e esbanjando qualidade, ele já é o cara do momento, junto com o australiano Owen Wright, no WQS. Dois goofies que prometem bons duelos na divisão de acesso nesta temporada. Por enquanto, o aussie segue na frente com um aproveitamento melhor e também com um surf de encher os olhos, inclusive uma vitória cheia de autoridade sobre Kelly Slater no Rip Curl Pro em Bell's, segunda etapa do Mundial. Como há muita estrada ainda, o Brasil tem uma grande chance de abiscoitar outro título do WQS, só que com um cara que promete entrar para o rol dos melhores e não apenas ser mais um. Jadson André me parece fadado para voos altos, bem acima do que estamos acustumados a ver.

Pressão nele? Quem quer ser o melhor precisa segurar a peteca cedo, aguentar o rojão e mostrar que ansiedade pode se transformar em energia. Este ano, que tinha tudo para ser de Adriano, tem a cara do André.

Insaciável


O maior campeão mundial de todos os tempos dificilmente largará o caneco. Agora, a saga pelo tão esperado décimo título mundial´está garantida, pelo menos financeiramente. Isso porque Kelly Slater renovou seu contrato com a Quiksilver por mais cinco anos. Embora o eneacampeão mundial não tenha tido um primeiro semestre produtivo, o cara é sempre uma caixinha de surpresas. "Não poderíamos estar mais orgulhosos em estender a nossa duradoura relação com o melhor surfista que o esporte já conheceu. Kelly vem sendo um fantástico porta-voz, um ótimo embaixador e promotor do surf, e um verdadeiro amigo. Estamos completamente satisfeitos em continuar com essa parceria", disse Robert B. McKnight, presidente da Quiksilver.

Segundo Kelly, que ficou em quarto lugar na lista 2008 da Revista Forbes sobre os esportistas radicais que mais faturam (com uma renda de 3 milhões de dólares), a notícia da renovação talvez não seja uma surpresa para muitas pessoas, pelo tempo e envolvimento que tem com a empresa. Porém, o norte-americano revela que os próximos cinco anos serão os melhores "pois colocaremos nossas mentes e forças juntas para capturar nosso estilo de vida e criar produtos que reflitam isso". A máquina de competir ainda desafia: "um novo tempo está para começar".

De molho na areia


Impressionante como os problemas do corpo parecem pequenos à dor psicológica causada ela impossibilidade de surfar. Já perdi a conta do número de vezes que vi surfistas chorando feito crianças, porque estavam intimidados, por motivos médicos, a ficar longe da água salgada.

No Tombo, há alguns anos, por conta do esgoto que saía no Bostrô, houve uma epidemia de hepatite. Imagine só, a galera desesperada quando o diagnóstico apontava para pelo menos um mês de cama. Tinha neguinho que com duas semanas largava o tratamento e preferia arriscar uma seqüela no fígado, a amargar a perda de um canto direito de gala. Sobreviveram.

Tenho um amigo que em menos de um ano conseguiu duas lesões graves. Na primeira, jogando futebol, adquiriu uns pinos no tornozelo e dois meses fora d'água. Foram intermináveis dias de queixas pelo MSN. Da segunda, surfando, conseguiu uma torção no joelho, que rendeu um enxerto no ligamento e seis meses fora da cena. Desta vez, conseguiu a solidariedade do fisioterapeuta que também é surfista e exibe um joelho "turbinado" com pinos. Ele garante que preferia morrer se tivesse que deixar de surfar. Um tanto quanto radical, mas bem próximo do sentimento que afeta os fissurados que são obrigados a fincar os pés na areia enquanto o corpo se recupera. Aliás, outro dia escutei uma definição bem engraçada: um desesperado de plantão diz ter descoberto duas coisas importantes quando teve que ficar uns meses no seco: a primeira foi que detesta praia e a segunda que os melhores mares quebram quando você não pode entrar. Faz sentido.

Surfistas realmente parecem sofrer algum tipo de metamorfose quando passam um tempo fora do mar. Sabe aquele comercial do garotão na piscina do clube, quase morrendo, que só recupera os sentidos quando os amigos o seqüestram e jogam no mar? E aí rolam tentativas desesperadas pra salgar o corpo e a alma. E dá-lhe filme, revistas, games de surf virtual. Vale tudo pra sentir-se o mais próximo possível da sensação de deslizar pelas ondas. Mas, como não há mal que sempre dure... Um dia o corpo se recupera e você percebe que toda a privação só serviu pra estimular ainda mais seu tesão e a volta é sempre triunfal com gosto de primeira vez.

Na real, esse texto surgiu no dia em que um grupo de amigos, no qual me incluo, descobriu que um dos tripulantes estava com câncer e um tipo de câncer que afeta os ossos. O susto da notícia foi minimizada pela informação de que há cura, mas quando soubemos que por conta do risco de fraturas haveria a necessidade de ficar longe no mar, a indignação foi unânime: "mas essa médica sabe das seqüelas que a falta do surf vai trazer?" Não, ela não sabe. Nem imagina. Isso é o surf!

Sabemos que em breve o nosso brother vai voltar e a galera estará lá no outside esperando pra dropar junto. A única preocupação é que esse cara é tão fominha, daqueles que pega uma e sai remando de volta feito um louco pra não perder nada, que já está todo mundo se preparando, porque a volta vai ser irada.

Faça você mesmo

A era digital, um dos braços da era da informação, é imprevisível. Em 2004, uma empresa situada no norte da Califórnia se lançou no mercado com uma linha de pequenas câmeras “faça você mesmo” voltada para alguns esportes radicais específicos. Com o sugestivo nome de GoPro, os caras começaram a produzir equipamentos que podiam ser acoplados aos carros de corrida, capacetes de moto e, o mais relevante para nós, pranchas de surfe.

Voltando um pouco no tempo, as câmeras GoPro são conseqüência do crescimento desenfreado do mercado digital, principalmente sua vertente para amadores. Os grandes fabricantes investiram maciçamente em câmeras fotográficas e filmadoras totalmente voltadas para a maior fatia do mercado, a do consumidor amador. Graças à tecnologia digital tudo se tornava mais viável e simples, desde o clique a impressão. Esse tipo de produção ganhou espaço e se desenvolveu rapidamente, até tornar-se acessório obrigatório do homem do século XXI. Fatos esses que, em pouco tempo, se tornaram uma dor de cabeça para os profissionais da área de mídia. No caso do surfe quem mais sofria eram fotógrafos e vídeo-makers, vendo a linha que divide o profissionalismo e o amadorismo cada vez mais tênue. Muitos conservadores se recusaram por bastante tempo a usar equipamentos digitais alegando a falta de qualidade, se comparado à película. Mas, salvando-se casos muito específicos, isso é puro papo. O digital vinha engolindo tudo e todos que não o acompanhavam. Porém, em 2004, quando a GoPro foi lançada como grande revolução para surfistas amadores, poucos deram bola e nem de longe era uma ameaça à fotógrafos e vídeo-makers, graças a um simples fato: ninguém usava a tal câmera. O produto era visto como tão amador que chegava a ser de “prego”, o bom surfista arrumava alguém que fizesse suas imagens, nem que fosse com aquela câmera digital mais vagabunda que vendia através de um 0800.

De volta a 2009, fica a pergunta: o que mudou nessas câmeras para se tornarem a febre, entre surfistas amadores e profissionais, que são atualmente? Entre muitas respostas, uma se sobressai: a publicidade. A empresa, no ano passado, investiu forte em atletas capacitados que divulgaram imagens produzidas com a GoPro em ondas de respeito. Todos viam com os próprios olhos o potencial do produto.

Outra grande propaganda foi feita de tabela por caras como Brian Conley e Timmy Turner, nos filmes “My Eyes Wont Dry” e “Second Thoughts”. Apesar de usarem um equipamento muito mais sofisticado do que a GoPro, a “tube vision” é praticamente a mesma. Assim, a “xeretinha”, que já foi tirada de “prega”, deu a volta por cima e é considerada atualmente inimiga nº1 dos que vivem de produzir imagens de terceiros, também conhecidos como fotógrafos ou vídeo-makers. Mas também se tomou uma das melhores amigas dos surfistas.

A arte de entubar


É A MANOBRA MAIS DIFÍCIL E DESEJADA
Estimativas apontam que menos de 5% dos surfistas de todo o mundo dominam a técnica para se colocar constantemente dentro de tubos. Além da dificuldade da manobra, são poucas as ondas consistentes que quebram tubulares e com uma boa formação. A maioria dos tubos não dura mais de três segundos. Em uma pequena elite de picos de surf, como Kirra, na Austrália, e G-Land, na Indonésia, os tubos podem durar até 15 segundos em dias épicos.

PASSOU A SER FREQÜENTE NOS ANOS 60
Até a década de 50, pegar tubos era algo raro. No início dos anos 60, os havaianos Conrad Cunha e Sammy Lee passaram a entubar com regularidade. O californiano Butch Van Artsdalen é conhecido como o primeiro tube rider da história. Artsdalen conquistou tal reputação com as suas performances épicas em Pipeline, onde estabeleceu os novos padrões, com um tubo surfado em novembro de 1962, ao ser coberto pela onda e cuspido para fora como um foguete.

FOI REVOLUCIONADA NA DÉCADA DE 70
Nos anos 70, o sul-africano Shaun Tomson e o havaiano Gerry Lopez mostraram ao mundo novas maneiras de permanecer o mais tempo possível entocado. Tomson, campeão mundial em 1977, desenvolveu uma técnica própria de manobrar a prancha, enquanto encoberto pela crista da onda, que permitiu que ficasse mais fundo do que qualquer outro surfista da época. Lopez chocou o público com a extrema calma e confiança com que botava para dentro nas maiores ondas de Pipeline. O seu jeito zen de entubar virou referência de estilo e ainda hoje é imitado por surfistas de todo o planeta.

SÃO PEGOS HOJE EM ONDAS DE ATÉ 50 PÉS
Até a década de 90, a esmagadora maioria dos tubos era surfada em ondas de no máximo 15 pés. Não eram comuns as tentativas em ondas gigantes até que big riders, como os havaianos Titus Kinimaka e Brock Little, passaram a se colocar dentro de tubos monstruosos em Waimea. O tow-in possibilitou que a barreira fosse rompida: rebocado por um jet-ski, o surfista tem condições bem belhores de se posicionar em lugares mais críticos. Hoje, os mais corajosos surfistas de ondas gigantes pegam tubos em ondas de até 50 pés em Jaws, na ilha de Maui, no Hawaii.