FAST FOOD OU À LA CARTE?


"Para te inspirar cada vez mais e ajudar a revelar pra galera a essência do surf".


A frase escrita no envelope sobre minha mesa era do fotógrafo Marcelo Bicudo, que sabendo e compartilhando da minha saudável obsessão por todo tipo de publicação relacionada ao surf, me enviou duas jóias raras.

Uma delas era o primeiro número da extinta Brasil Surf. A outra era a edição de outubro de 1976 da revista americana Surfing.

Em poucos segundos comecei a folhear as páginas amarelas dessas valiosas relíquias, com todo cuidado para que elas não se desintegrassem em minhas mãos. A cada página virada, eu voltava um pouco mais no tempo, entrando sem perceber numa viagem incrível, sem sair do lugar. Larry Bertlemann, Pepê Lopes, Mark Richards, Ricardo Bocão, Mark Warren, PT, Freddy Koester, Michael e Shaun Tomson, Kadinho Meyer, George Greenough e Rico eram alguns dos que estampavam, a cores e em preto e branco, as matérias e anúncios de ambas as revistas ─ publicadas quando eu ainda nem era nascido. Alucinando com as fotos desses mestres deslizando e manobrando em suas single fins, encontrei um texto de Richard Dowdy, então editor da Surfing, que me chamou a atenção.

"A Terra está rapidamente se transformando numa vila global. Tecnologia e comunicações estão em praticamente todos os cantos do mundo, mundando nossos valores e transformando nossa paisagem".


Fiquei pasmo com a relevância atual de uma frase escrita há 34 anos. Ainda mais quando a mídia especializada de hoje atravessa essencialmente a mesma situação.

Nessa era de internet, sites, blogs e páginas de relacionamento ─ onde o imediatismo é a norma ─ a comunicação de conteúdo e a maneira como o consumimos transformou-se drasticamente. E isso é muito positivo.

Não há como negar que a internet mudou a maneira como hoje acompanhamos o mundo do surf. Lembra como chegávamos na praia ansiosos para ver o que a frente fria iria produzir? Hoje sabemos com dias de antecedência como estarão as ondas, o vento, a maré e o período. E quando tínhamos de esperar dois meses para saber o resultado de um evento? Atualmente acompanhamos tudo ao vivo em HD, com replay, comentário e entrevista na areia.

Os blogs, twitts e páginas de relacionamento, por sua vez, possibilitam um canal direto entre os surfistas e o mundo digital. Ficamos sabendo quase que instantaneamente, por exemplo, que as pranchas de C.J. Hobgood foram roubadas na França e que Peter Mel puxou a cordinha de Dennis Tihara durante um campeonato no México.

Enquanto o dinamismo de novos meios encaixa-se perfeitamente com certos conteúdos, em troca enaltece os pontos fortes da mídia impressa. As revistas de srf que se adaptaram a essa nova realidade estão melhores e mais relevantes do que nunca.

Pois é através delas que temos acesso a textos mais densos, análises mais aprofundadas, opiniões de colunistas de peso, entrevistas extensas e toda a textura da melhor fotografia aquática existente. A natureza do meio pede uma leitura mais tranquila, analítica e reflexiva.

Isso sem falar que revista você pode levar para a praia. Ou ler no banheiro. Ou deitado na rede. Você não precisa estar na frente de uma tela, nem próximo de uma tomada. Aquela foto que te fascinou você recorta e cola na parede. Revista você coleciona e deixa orgulhosamente esparramada na mesa de centro.


Internet é fast food. Impresso é à la carte. Website você devora. Revista você saboreia. Tudo depende do seu apetite.

Um não anula o outro e ambos são válidos em suas distintas propostas. Por isso mesmo as boas revistas sempre existirão ─ trazendo ainda mais inspiração e essência ao leitor que sabe o que quer.