CULTURA AMEAÇADA

Longboard é sinônimo de história, sendo a modalidade do surf que melhor representa o desprendimento e alegria que caracterizou os primórdios do esporte. Também é sinônimo de outros valores essenciais, como respeito, união e estilo, sempre baseados em classe e harmonia.

Isso tudo ainda é evidente, mas se o tempo pode ser benéfico para algumas coisas, também pode abrir um buraco enorme numa cultura. A massificação do longboard anda a passos largos, principalmente pela adesão da molecada e não há dúvidas que isso tem um lado positivo. Mas seria bom se os novos praticantes enxergassem os aspectos fundamentais de uma cultura que envolve atitudes singelas, mas extremamente expressivas. Sempre comento que longboard é surf, um esporte radical por natureza, mas para que sua raiz não se perca no meio de tanta pancada, é preciso muita atenção da nova geração. Digo atenção deles, porque não falta boa vontade aos antigos em procurar manter viva a elegância de tantos anos e passar isso adiante.

O maior problema talvez seja a forma como se vem surfando atualmente. Pranchas com muito rocker, finas e estreitas demais, contribuem para um surf de base aberta, obrigando o cara a matar milhares de baratas para conseguir alguma manobra na rabeta. A fluidez, estabilidade e harmonia ficam comprometidas e o noseriding vira aquele Deus nos acuda. É um tal de se rastejar até o bico, que dá nojo de ver. Felizmente tem uns moleques que são mestres quando o assunto é prancha grande. Os californianos são os que melhor parecem assimilar a história, embora pequem na camaradagem, muitas vezes achando que só eles sabem o que é surf de longboard. Mas que eles entendem do assunto, ninguém pode negar. Alex Knost, Joe Aaron e Tommy Witt são exemplos de garotos que conseguem absorver todos os fundamentos técnicos e históricos. Seguindo a mesma linha, aqui no Brasil, Marcelo Carbone e Alexandre Wholters são dois filhos natos do longboard, com vantagem de serem humildes e amigáveis, provando para seus contemporâneos gringos que surf decente também se faz fora d'água.

A falta de respeito com a história acaba gerando a descaracterização da cultura, colocando-a sob ameaça de extinção. Isso tudo é fomentado pela egotrip de alguns surfistas quando começam a deslanchar em cima dos seus pranchões. Muito marmanjo que andava morto no surf por não conseguir fluir com uma 6 pés, quando pega uma 9 pés e consegue alguma coisa, acha que está no céu e nem se liga se está fazendo surf de longboard ou simplesmente se está surfando com uma pranchinha alongada. Desde que ele mantenha o ego controlado, não tem nada demais. O pior é o moleque que era gordinho e desengonçado e por isso teve que aprender a surfar com um longboard. Passa um tempo e ele vai pegando o jeito, até começar a competir. Aí com 17/18 anos pensa que sabe tudo e sai ignorando a história e seus personagens, só porque ganhou umas bateriazinhas aqui, outras ali, fez umas viagens para o Hawaii que o pai bancou, mas nunca surfou Pipe ou Sunset de verdade. Isso soa como um escracho à alma de qualquer surfista de bom senso, principalmente para quem respeita a cultura do longboard.

Resgatar a história, unir-se em torno dessa paixão e divertir-se com classe é a melhor forma de manter viva nossa cultura, que abomina atitudes contrárias a essas. Isso é longboard, o que se tem visto por aí é balela!