A HORA DA VERDADE

ESTE MÊS TEM INÍCIO MAIS UMA ELETRIZANTE DISPUTA ENTRE OS MELHORES SURFISTAS DO MUNDO EM BUSCA DO TÍTULO DE CAMPEÃO DO ASP WORLD TOUR 2011. A PRIMEIRA BATALHA COMEÇA NA GOLD COAST, AUSTRÁLIA, E A CORRIDA TEM SEQÜÊNCIA COM MAIS DEZ ETAPAS NOS PRINCIPAIS PICOS DO PLANETA, INCLUINDO UM AINDA DESCONHECIDO (THE SEARCH) E UMA NOVIDADE: NOVA IORQUE, SEXTA ETAPA DO CALENDÁRIO, QUE MARCA A PRIMEIRA ROTAÇÃO NO RANKING MUNDIAL. A SEGUIR, APRESENTO OS CINCO ATLETAS QUE DEFENDERÃO A BANDEIRA DO BRASIL NO PRIMEIRO SEMESTRE DO CIRCUITO DOS SONHOS, COM UMA ANÁLISE PRECISA SOBRE AS QUALIDADES E DEFICIÊNCIAS DOS NOSSOS GUERREIROS.

Como acontece em quase todo começo de temporada nos últimos anos, a dúvida que paira no ar é se Kelly Slater vai ou não continuar no Tour e defender seu título. Deve ir. Afinal, ele provavelmente ainda não se enxerga fazendo algo além do que faz melhor. As opções podem ser complexas. Largar o osso no auge ou adentrar à nova era da ASP, já que continua em plena forma, tanto no surf como no xadrez mental que o levou aos dez títulos mundiais. As duas primeiras etapas na Austrália podem ser decisivas: se for bem corre o circuito todo, se for mal pode abandonar as competições. Enquanto Slater não decide, é bom lembrar que tem gente na fila.

O vice-campeão mundial Jordy Smith é ousado, esfomeado e não se assusta com ninguém. O problema é que ainda precisa colar para passar por algumas provas, segundo o professor Slater. Jogar manobras malucas em momentos errados pode custar caro. Campeão? Não me espantaria, mas não me lembro de uma curva na base que tenha impressionado. Quanto ao resto do quadro, impressiona, e muito. Mick Fanning, atual terceiro do mundo, está sempre correndo por fora ─ ou por dentro, se houver tubos. Continua com o mesmo foco, preparo e velocidade em qualquer condição e certamente será pretendente ao título. Talvez a nova geração o force a jogar um pouco mais seus aéreos. Joel Parkinson mostrou que está no páreo com seu retorno incrível em 2010 e a conquista da Tríplice Coroa. Mas seu estilo casual, tão característico e venerado por alguns (inclusive eu), pode deixar de chamar a atenção dos juízes, especialmente em ondas pequenas. Título provável, mas pelo talento, e não pela retrospectiva amarelada.

Taj Burrow é outro que não nunca desiste. Será fundamental que tenha um bom começo de ano na Austrália, para reconstruir a confiança. Taj tem que retomar seus aéreos de maneira mais contundente para enfrentar o novo cenário ─ justamente ele, que foi um dos precursores dessa brincadeira. Merece um título, nem que seja pelo conjunto da obra, mas lhe falta consistência quando o mar fica mais pesado e parece não lidar muito bem com a pressão de liderar o ranking.

Dane Reynolds operou o joelho em janeiro e fica fora do primeiro evento, mas não deve se abalar. Ele é o que é, até que prove o contrário. Suas manobras, mesmo quando fora de hora, são um show à parte, mas nem sempre decidem bateria. Título? Para ele, parece que tanto faz. Bede Durbidge deve continuar o mesmo sujeito tranqüilão, mas agora com o peso de ser pai de família. O que lhe sobra em amplitude de manobras às vezes falta em versatilidade em espaços mais curtos.

Owen Wright é um goofy empolgante e destemido, mas ainda lhe falta Power, que pode ser compensado pela diversidade e pelo alto risco de suas manobras. O melhor estreante de 2010 vai continuar dando trabalho, mas não creio num título agora.


ALEJO MUNIZ
Natural de: Bombinhas, Santa Catarina
Idade: 20 anos (22/02/1990)
Temporadas na elite: 2011 é o ano de estréia de Alejo

O argentino naturalizado brasileiro é o único estreante entre os cinco representantes do Brasil na elite. Aos 15 anos foi morar sozinho no Guarujá com o objetivo de evoluir. Teve uma carreira brilhante como amador e foi campeão mundial sub-18 com a vitória no ISA World Junior em 2008. Apesar de não ter vencido nenhum evento em 2010, conseguiu sua classificação graças à enorme constância que teve durante o ano.

O que esperar em 2011? O surf de Alejo tem dinâmica e power e deve fazer um belo estrago na galera que balança, mas não cai. Diante dos Tops, que a meu ver são na realidade uns 16, a coisa muda de figura, mas ele é um competidor nato e não deve se assustar. Poderá ser a prova viva de como um novo patrocinador pode modificar as perspectivas de uma carreira. Claro, seu talento no ar e a facilidade de cravar as bordas o credenciam a escalar os degraus da fama, porém há muito trabalho pela frente. As três primeiras etapas do Tour (Gold Coast, Bells e Brasil) favorecem seu surf e podem lhe proporcionar um começo de temporada melhor do que o esperado.


RAONI MONTEIRO
Natural de: Saquarema, Rio de Janeiro
Idade: 28 (07/05/1982)
Temporadas na elite: 2004: 25º / 2005: 32º / 2006: 39º / 2007: 34º

Surfista mais completo do quinteto brasileiro, Raoni nunca conseguiu deslanchar na elite: em quatro temporadas, sua melhor colocação foi um 25º lugar. Em 2008, não conseguiu se classificar e ainda perdeu o patrocínio. Passou dois anos penando no antigo WQS sem êxito e, quando muitos já duvidavam de sua capacidade, deu um grande salto em 2010. Assinou com a O’Neill e conseguiu sua vaga justo no ano mais difícil vencendo a etapa de Sunset, no Hawaii.

O que esperar em 2011? O mais experiente do time verde e amarelo é um dos surfistas mais talentosos que o Brasil já teve, inclusive em ondas pesadas, graças aos treinos em Saquarema, onde mora. Seu poder de recuperação nas manobras é impressionante. No entanto, sua personalidade desprovida de um “sistema auto-foco” carece de maturidade. A chave de seu sucesso reside no equilíbrio. Responsabilidade que lhe dê foco, sem estragar o espírito selvagem que transparece nas manobras absurdas. Queria muito tê-lo visto competindo em Backdoor. Quem sabe em 2011? Em tubos sérios para a direita ele é um problema, mas precisa melhorar seu backside em ondas tubulares e de linha e manter a constância nos campeonatos.


HEITOR ALVES
Natural de: Fortaleza, Ceará
Idade: 28 anos (03/04/1982)
Temporada na elite: 2008: 25º / 2009: 28º

Um dos muitos nordestinos que deixaram sua terra natal para viver no Rio de Janeiro em busca de oportunidades e ondas mais consistentes, o cearense estreou na elite em 2008. Logo em seu primeiro ano, seu estilo fluído e a facilidade para voar impressionaram até o mito Kelly Slater, que chegou a declarar que gostaria de treiná-lo. Mesmo parecendo sentir a pressão quando encarava os Tops, ele conseguiu se classificar pelo ranking do antigo WCT. Em 2009, quando todos achavam que ele iria estourar, acabou saindo da elite. No ano passado recuperou a confiança e venceu três etapas 6 estrelas e uma Prime, sendo o melhor surfista fora da elite no World Ranking e reconquistando sua vaga no World Tour.

O que esperar em 2011? O cearense sabe como é diferente competir contra os melhores. Não sei se com todo o trabalho que teve para reconquistar a vaga lhe sobrou tempo para surfar ondas pesadas e de linha, pois é disso que ele precisa, com atenção especial ao backside. Se puder aproveitar o tempo para consolidar seu surf em ondas sérias dará um belo salto. Precisa manter a constância que teve o ano passado nas etapas do Qualifying, algo que nunca apresentou nos dois anos em que figurou na elite.


JADSON ANDRÉ
Natural de: Natal, Rio Grande do Norte
Idade: 20 anos (13/03/1990)
Temporadas na elite: 2010: 13º

Em sua primeira temporada na elite, no ano passado, o potiguar teve um desempenho melhor do que o esperado e venceu a etapa brasileira, derrotando na Inal ninguém menos que Kelly Slater. Assim como Alejo, saiu de casa e se mudou para o Guarujá para treinar e evoluir. A estrutura de seu patrocinador foi fundamental para Jadson chegar até aqui. Poderia ter fechado o ano numa posição melhor não fossem alguns detalhes. Às vezes o mar não colaborou, mas isso acontece com todo mundo, ou quase.

O que esperar em 2011? No fim das contas os detalhes fazem diferença, por isso ele precisa corrigir aquela balança de prancha entre uma curva e outra. Às vezes os juízes observam isso como falta de link entre as manobra. Foi bom vê-lo vencer baterias sem ter que jogar seu aéreo rodando como coringa e houve progresso no seu backside e nas ondas pesadas e de linha, seus pontos fracos. Seu surf e postura na elite da ASP estão cada vez mais sólidos. Tem atitude e não se intimida diante dos adversários, mesmo respeitando a maioria deles.


ADRIANO DE SOUZA
Natural de: Guarujá, São Paulo
Idade: 24 anos (13/02/1987)
Temporada na elite: 2006: 20º / 2007: 28º / 2008: 7º / 2009: 5º / 2010: 10º

Carrega desde cedo o peso de ser considerado o brasileiro com maiores chances de trazer o título mundial. Dono de uma carreira precoce, Mineirinho foi o atleta mais novo a vencer uma etapa do circuito brasileiro, aos 15 anos. Com apenas 18 anos conquistou o título do WQS (que não existe mais) com extrema facilidade. O local do Guarujá ficou entre os Top 10 nos últimos três anos, mas em 2010 não fez nem um pódio ─ pouco para quem sonha em ser campeão mundial. Tem um surf maduro para sua idade, mas isso tem seu lado bom e ruim. É o surfista mais escolado na elite entre os representantes brasileiros e conhece bem a maioria dos locais das etapas.

O que esperar em 2011? Mineiro tem um plano, um objetivo, e isso sempre fez diferença. Mudou seu quiver e talvez ainda não esteja completamente adaptado. Deve imprimir um surf mais pesado este ano e suas vitórias vão depender bastante de seu equilíbrio psicológico. Claro, ainda pode melhorar o estilo e a técnica nos tubos de backside e arriscar mais nas manobras para ser menos previsível. Mas, com suas cavadas, é só uma questão de sintonia fina para que sua prancha vá aonde ele quiser. Já provou que sabe jogar de igual para igual com os melhores do mundo ─ Slater chegou a compará-lo em com o falecido Andy Irons. Ninguém pode tirá-lo de onde está, só cabe a ele encontrar o caminho do topo. Os treinos em picos como Puerto Escondido, em janeiro passado, mostram que está tentando elevar seu surf a outro patamar. Ficou devendo pelo menos um pódio em 2010.