SLATER É GRANDE DEMAIS PARA O SURF


Kelly Slater como atleta é uma aberração da natureza. Basta dizer que o cara pode muito bem, ainda este ano, botar no bolso o tal décimo título mundial. Um feito que, diga-se de passagem, todo mundo adoraria que acontecesse. Ele é um freak. Quem nesse planeta já conseguiu tamanha proeza? Ninguém. Nem no tênis, nem no boxe, nem na natação, nem no golfe. Assistindo à Copa do Mundo pensei em como os americanos precisariam de um ídolo como Kelly Slater no futebol deles, pra coisa explodir por lá.

Os Estados Unidos não estão nem aí pra futebol, mas um astro como Kelly resolveria esse problema. Americanos são fanáticos por esportes. Leia-se esportes inventados por eles, como os chatérrimos futebol americano e basebol, que são bilionários na terra do Tio Sam. Sem falar dos esportes em que eles são os maiorais, como basquete, golfe e tênis. Essa turma ganha muito dinheiro e as cifras são astronômicas. Kelly Slater sabe disso. Ele sabe a importância que tem no universo do surf. E com certeza se ressente de seus feitos não fazerem nem cócegas na grande imprensa, nem nas grandes verbas de marketing.

Tirando os surfistas, e a Pamela Anderson, ninguém mais sabe quem é Mr. Kelly Slater nos “States”. Por mais que ele tenha pagado aquele mico, em cadeia nacional, fazendo uma equivocada ponta em Baywatch, por mais que tenha dado uns pegas na Gisele, ou ensinado a Cameron Diaz a surfar, Slater ainda é um penetra nessa festa milionária. Kelly Slater está no topo da pirâmide do surf. É o atleta mais valioso, mais bem pago, mais bem-sucedido, mais tudo. O problema é que essa pirâmide é bem baixinha e o monte de dólares não passa de um acanhado bolinho, quando o comparamos com os outros esportes.

Ele é o verdadeiro peixe grande num aquário pequeno. E se o surf não tem o dinheiro que ele acha que merece estar faturando, qual a solução? Fazer o esporte crescer ainda mais, atrair grandes corporações, batalhar pela entrada do surf nas Olimpíadas, pode ser uma boa idéia. Pra que o nosso superstar ganhe ainda mais dinheiro o surf precisa se agigantar. Mais exposição significa mais patrocinadores, que é igual a mais dinheiro. E que, infelizmente, é igual a mais gente na água. Muito mais gente.

Sou fã do Kelly Slater, mas seus movimentos na direção do pote de ouro me causam arrepios. O surf não vai conseguir absorver essa gente toda. Quando “Wall Street” se interessar pelo surf, o dinheiro pode até entrar, mas os verdadeiros surfistas vão acabar saindo de fininho, totalmente decepcionados com o rumo das coisas. A conta não fecha. Teremos sempre a mesma quantidade de ondas nesse amado oceano. Num certo sentido, Kelly Slater é grande demais pro surf, esporte de equilíbrio extremamente frágil.

Slater faria melhor ao surf se tivesse vindo ao mundo como estrela de futebol, esporte capaz de acolher todos os seus sonhos dourados. Eu acharia o máximo assistir pela televisão ao careca incendiando milhões na Copa do Mundo e fazendo do futebol, esse sim, o esporte mais popular e mais rico da América. Já posso até ver a comoção nas revistas de fofoca, os contratos milionários, as mansões, o namoro com as estrelas, a farra com os negões do rap...