11 perguntas para... Maya Gabeira

ELA COMEÇOU A SURFAR INCENTIVADA POR UM NAMORADO, EM UMA ESCOLINHA DO ARPOADOR, NO RIO DE JANEIRO. COM APENAS 8 ANOS ENTRE VACAS ASSUSTADORAS E DROPES BEM-SUCEDIDOS, A CARIOCA MAYA GABEIRA, 23, JÁ ENCAROU ALGUMAS DAS ONDAS MAIS PERIGOSAS DO MUNDO E GANHOU DESTAQUE MUNDIAL AO VENCER TRÊS VEZES CONSECUTIVAS O BILLABONG XXL GLOBAL BIG WAVE AWARDS.



01. POR SER MULHER, OS CARAS TE DÃO UM TRATAMENTO DIFERENCIADO? ROLA UMA PROTEÇÃO EXTRA?
Acho que sim, mulher você não trata que nem homem, né?! (risos). Eles me protegem com certeza, acho que isso é da natureza. Viajando com uma menina, normalmente o cara em a tendência de protegê-la e ajudá-la.

02. VOCÊ APRENDE MUITO COM ELES?
O tempo inteiro. Para evoluir, não vai ser viajando com a galerinha ou com as minhas amigas. Imagina se eu estivesse com uma amiga em Mavericks, e não com Danilo Couto, no dia em que pegamos o pico sinistro. Lógico que eu não teria surfado. Só uma pessoa que nem o Danilo para olhar e não conseguir ver o line-up, não conseguir ver as pedras logo ali ao lado e falar: “Não, vamos de qualquer jeito, está 30 pés clássico!”. Essa é a diferença. Homem tem uma visão no surf que é absurda. Eles sabem tudo de ondulação, de mapas e tudo de equipamentos. O lugar e a hora certa. É muito impressionante, você não vê mulher assim. Eu sempre falo: “Gente, como eu vou andar com mulher?” Você não tem um Jeff Clark mulher em Mavericks, um Andrew Marr mulher na África do Sul... e assim por diante.

03. COMO VOCÊ DECIDIU FAZER TOW IN?
É tudo muito recente, mas além de achar que era uma boa hora, o principal fator foi a oportunidade. Surfando com o patrocínio da Red Bull, tenho facilidade de ter jet-skis no Brasil e no Hawaii. E ter o Burle na mesma equipe, que pode estar comigo, sair comigo e está a fim de me ajudar, de me ensinar, facilitou tudo. E o principal: chega uma hora que você encontra o limite da natureza, onde não é possível entrar nas ondas remando.

04. VOCÊ JÁ SE SENTE PREPARADA PARA ENCARAR ESSE TIPO DE SITUAÇÃO NO TOW IN: PEGAR MAVERICKS, JAWS OU TODOS SANTOS NOS DIAS MAIORES? ACHA QUE CHEGOU NESSE NÍVEL FÍSICO E PRINCIPALMENTE PSICOLÓGICO?
Ainda não cheguei. Mais é um esporte novo para mim e ainda não tenho intimidade com a máquina e com o equipamento. Vai ser como foi na remada, no momento que eu entender o que estou fazendo realmente, quando conhecer a prancha que eu estou usando e puser meu tempo naquilo. Aí sim, a confiança vai vir. Se você não botou seu tempo naquilo, não vai estar preparado para puxar seu limite e chegar em uma condição extrema. Eu tive confiança para surfar Waimea, com a baía fechando, por exemplo, mas até esse dia, eu já tinha ido uma, duas, três, quatro vezes e ficado milhões de horas olhando. Aí sim você fala: “Tá bom, acho que agora estou a fim de tentar, porque eu boto meu tempo, me dedico, estou focada e amo o que eu faço. Vou tentar ir mais longe”.
Acho que com o tow in será o mesmo. Vai ser um ano, dois, três, até eu estar tão confortável com a máquina, com o resgate e com um parceiro estável. Se estiver tudo no esquema, acho que será possível surfar qualquer tamanho.

05. NUMA DUPLA DE TOW IN, UM FICA RESPONSÁVEL PELA VIDA DO OUTRO. O RESGATE ACONTECE MUITAS VEZES EM PLENA ZONA DE IMPACTO, NUMA SITUAÇÃO SINISTRA. VOCÊ SE SENTE PRONTA PARA ARRISCAR A VIDA NA FRENTE DE UMA BOMBA DE 50 PÉS, PARA SALVAR SEU PARCEIRO?
Eu me vejo fazendo isso. Acredito que eu possa chegar nesse nível. Estou disposta a correr riscos. Vai ser uma evolução natural, entendeu? Que dá medo, dá. Mas eu estou há uns três meses enfrentando essa realidade e converso muito com o Burle sobre isso. Sei que esse é um estágio novo e que você se coloca em umas situações que podem ter conseqüências horríveis. Muito mais extremo do que se você estivesse na remada. No braço, você não teria ido parar ali, você tem um instinto e milhões de coisas que não te deixam estar naquela situação, onde a máquina te deixa. Mas, rebocado, você se vê botando para dentro muito mais fundo, na primeira da série, dropando atrás do pico, coisas assim. É muito complicado. Eu sempre falo para o Burle: “Cara, quem é o louco que fala que tow in é fácil?”. Não existe esporte mais extremo, em alta velocidade e com tanto impacto.

06. COMO FUNCIONA ESSA PARCERIA COM O BURLE?
É uma grande amizade e ao mesmo tempo um grande desafio para nós. Ele tem 40 anos, é um cara top no esporte. Ele olha pra mim, uma menina de 23 anos, que surfa há 8, e deve falar: “Caraca, brother, que loucura... Onde será que eu vou conseguir chegar com ela?”. Acho que ele tem uma expectativa também, sabe? De quanto uma mulher pode evoluir dentro de um esporte tão masculino. E eu tenho o desafio de estar com meu físico, meu psicológico e meu ritmo juntos com os dele. Vai ter que ir rolando uma adaptação constante. A gente se fala por e-mail, estamos sempre em contato, sempre tentando entender o outro, fazer os planos certos, estar nos mesmos lugares. Acho que esta nova fase muito interessante. É um caminho longo.

07. A PARCERIA COM ELE EXISTE EM FUNÇÃO DA RED BULL?
Acho que se eu fosse da Red Bull e a gente não se desse tão bem, ele não ia querer entrar neste projeto de formar uma dupla mista. A coisa aconteceu mais da gente mesmo. Rola uma empatia e ele sabe que é uma coisa que eu desejo muito. Acho demais porque ele vê o quanto me dedico. Chegou um momento em que ele quer participar dessa evolução, me mostrar o caminho e também descobrir aonde será que consigo ir. Mas isso é muito cedo para saber. Nossa, eu sofro, apanho e fico destruída. Estive no Tahiti e tinha hora que eu olhava e falava: “Burle, isso aqui não é esporte pra mulher”. E ele respondia: “Agüenta!”. O corpo de homem é muito diferente do de mulher. A primeira vez que eu puxei no Tahiti tinha 4 pés de onda e já foi bem complicado, dá muito medo de perder o jet-ski. Surfar em Teahupoo é adrenalina pura. De repente vem uma ondulação, ele levanta e fala: “Vai, vamos nessa!”. Você não sabe no que está se metendo, e de repente está num buraco, muito mais fundo no tubo do que gostaria. É algo assustador (risos).

08. COMO É A SUA RELAÇÃO COM AS OUTRAS MENINAS COMPETIDORAS? PRINCIPALMENTE AS BRASILEIRAS, VOCÊ SOFRE ALGUM TIPO DE PRESSÃO?
Eu as vejo muito pouco e diria que não tenho uma relação. É estranho, mas no meu esporte não tem muita competitividade, e se você for pensar, eu não tenho que competir com ninguém. Eu não consigo nem ver o Billabong XXL como uma competição. Porque tudo que envolve o XXL acontece em dias tão extremos, que eu não penso em surfar melhor do que outra mulher. Penso mesmo em dar o melhor de mim, conseguir fazer a cabeça e sobreviver. Estar na água sempre em situações extremas, querer surfar o dia inteiro quando está gigante, fazer imagens, evoluir, surfar as maiores. Essa é minha pressão.

09. OS ATLETAS, EM GERAL, SEMPRE SE ESPELHAM EM ALGUÉM. E NO SEU CASO?
Eu nunca tive alguém que eu olhasse e falasse: “Nossa, eu quero chegar e ser aquilo”. Acho que sempre olhei para o mar e falei: “Nossa, eu queria surfar aquele tipo de onda”. Quando assisto aos filmes de surf, eu penso: “Quero surfar Teahupoo daquele jeito”. Mas com certeza os big riders como o Burle, Danilo Couto, Jeff Clark, são pessoas que me inspiram, e eu gostaria de um dia chegar no mesmo nível deles.

10. SEUS PAIS APROVAM SUA CARREIRA?
Com certeza me apóiam muito. Minha mãe é minha manager, e meu pai é um superamigo. Sempre falo com eles por e-mail ou por telefone. Mas é lógico que ficam bastante preocupados. Em setembro de 2007 fui capa do jornal “O Globo” e saiu na matéria que eu estava com a idéia de surfar ondas gigantes, com o Carlos Burle me rebocando. Minha mãe me mandou um e-mail me parabenizando e comentando assim: “Todo mundo veio elogiar sua coragem, mas tem mesmo que ser 20 ou 30 metros de onda? Isso me assusta”. Eles gostam, acham legal, mas ficam imaginando qual será o meu limite.

11. ATÉ QUANDO VOCÊ PRETENDE SEGUIR NA CARREIRA DE SURFISTA?
Ai, não sei. Vejo o Laird Hamilton e o Burle com mais de 40, por exemplo. Espero estar nessa faixa de idade, ainda no big surf. Acho que é uma carreira longa. Quanto mais experiência, melhor. Um ano melhor que o outro, sempre. Se você for segurando a onda do seu físico, se é uma pessoa preparada, que se cuida desde cedo, acho que dá pra estender até uns 45.