Silvana, a melhor.


Eu já tinha escutado algo parecido no meio do ano passado, quando um amigo meu viu uma filmagem de uma viagem de barco na Indonésia. "Teve um dia de ondas pequenas em Lance's Right que a Silvana apavorou. Ela estava num barco cheio de meninas famosas, mas era a única que chamava a atenção com as variações de aéreos que dava. Tinham mais três barcos no canal e vários surfistas bons na água, mas no final do dia os comentários no vídeo se concentraram no que a Silvana tinha feito dentro d'água naquela tarde".

Essa viagem das meninas pelo Oceano Índico fará parte do filme "Dear and Yonder", quase todo filmado em película 16mm e que, parece, vai fazer um lúdico e atual raio-x do surf feminino. A viagem aparece em lindas fotos na revista americana Surfing e, junto com a Silvana estavam outras seis surfistas de ponta: a atual bicampeã mundial Stephanie Gilmore, a campeã mundial Sofia Mulanovich e quatro das mais modernas e explosivas surfistas da novíssima geração ─ Sally Fitzgibbons, Coco Ho, Courtney Colongue e Malia Manuel.

A revista usa as fotos da viagem apenas como pano de fundo para o jornalista Travis Ferré traçar, de uma forma bem perspicaz, um pequeno perfil com algumas nuances do estado de espírito de cada uma na viagem e seus estágios atuais de desempenho nas ondas. Travis é elogioso de cabo a rabo com todas do grupo. Mesmo assim, chama a atenção os comentários relativos à Silvana.

Logo na legenda da foto mais irada da matéria, na qual Silvana está voando invertida de volta para a onda, o comentário é enfático e não deixa dúvidas quanto ao atual nível da brasileira: "Silvana Lima mudou completamente a maneira com que as garotas olham o lip. Na foto, atravessando mais alto em Lance's". E continua no subtítulo do seu perfil: "Ela tem aquela imprevisibilidade do Dane Reynolds e o talento para controlar essa imprevisibilidade com estilo".

Vamos combinar que, em apenas duas afirmações, a revista atribuiu quatro características difíceis de serem encontradas juntas num atleta. Revolucionária ("...mudou completamente a maneira..."), imprevisível (comparável ao fenômeno Dane Reynolds), talentosa e com estilo.

As coisas aconteceram meio rápido na vida da Silvana. Ela se mudou do Ceará para tentar a sorte no Rio. O preparador físico Christian Moutinho abriu os olhos do empresário Márcio Giugni, da Ability. Márcio fez contato com o Zé Paulo da Billabong, que já estava de olhos bem abertos. Outro preparador físico e técnico de surf, Pedro Robalinho, colocou-a nos trilhos andando forte e Silvana foi explodindo mundo afora.

Me lembro dela na França, competindo no WQS, soltando aéreos numa época em que as surfistas mais modernas só conseguiam imitá-la dormindo. Depois em Ubatuba, no Super Surf, fiquei de cara com a qualidade com a linha que ela fez nas quartas e na semi em ondas de qualidade com bom tamanho em Itamambuca. Na verdade, além da sua linda na onda, fiquei admirando o estilo em cima da prancha, a pisada forte e fluida do pé de trás. Me lembro bem de dizer para mim mesmo que era a primeira vez que eu via uma mulher surfando igual a um homem, sob todos os aspectos.

Tem outras frases na matéria da Surfing que definem bem o calibre atual do surf da Silvana e seu estado de espírito hoje em dia dentro e fora d'água.

"Você tem a impressão que qualquer coisa pode acontecer quando a Silvana Lima fica em pé numa prancha de surf."

"No barco, ela ficava na dela meio quieta, sociável, mas reservada. Mas, na água tudo mudava. Quando chegava à arrebentação, ela começava a rir, ficava empolgada, dava aéreos e passava a completá-los."

"Ela tomava algumas das piores surras da viagem pelas suas tentativas, mas sempre remava de volta para tentar denovo até conseguir."

"No barco, o respeito pelo talento da Silvana era sempre aparente. Era como se a Coco e a Malia só davam aéreos por causa da Silvana e você podia notar o quanto elas prestam atenção na Silvana."
A matéria fecha com um parágrafo que demonstra bem a influência que a Silvana teve na viagem. "Oh great!", disse a Stephanie um dia no barco. "Silvana acabou de dar outro aéreo. E, de uma hora para outra o marcador de surf progressivo acabou de andar mais uma marquinha para a frente. Steph e Sofia colocaram as suas cordinhas, remaram para fora e começaram a arrebentar os lips das ondas rapidinho."